Megadeth “Rust in Peace”: a história do maior álbum de thrash dos 1990s
Artigos 24 de Setembro, 2020 Metal Hammer
Como uns recentemente limpos Megadeth fizeram “Rust in Peace” – a obra-prima de 1990 que selou um lugar no Big Four do thrash metal.

Apesar do facto dos Megadeth terem sido concebidos e moldados como um acto de retaliação após a ejecção sem cerimónia de Dave Mustaine dos Metallica, os membros musicalmente mais aventureiros do Big Four seguiram um caminho calmo e intencional entre o lançamento do primeiro álbum e o sucesso nas tabelas com “So Far, So Good… So What!” de 1988.
Volatilidade das formações à parte, Dave estava a começar a apreciar os frutos do seu trabalho, pois a aclamação internacional e o respeito pelos seus esforços para impulsionar o metal levaram a digressões maiores, êxitos maiores e uma trajectória ascendente muito evidente. Infelizmente, à medida que o ímpeto aumentava, a formação que fez “So Far…” – Dave, o baixista David Ellefson, o guitarrista Jeff Young e o baterista Chuck Behler – estava no meio de um vício colectivo em heroína que ameaçava inviabilizar a banda. As coisas chegaram a um ponto bastante calamitoso durante o que deveria ter sido uma viagem triunfante à Europa para se fazerem vários concertos com Iron Maiden, culminando numa fatídica performance no Monsters Of Rock Festival de Donington, a 20 de Agosto de 1988.
«Quando viajámos, a cena das drogas estava descontrolada», relembra Dave. «Fizemos sete concertos com os Iron Maiden e o festival Monsters Of Rock – teríamos morrido e ido para o céu. Já lá tínhamos ido antes, e, quando ficávamos sem drogas, mudávamos para álcool. Infelizmente, desta vez, a transferência não foi tão graciosa quanto poderíamos esperar; tivemos que abandonar o resto da digressão e ir para casa. Isso foi o início do fim para o Jeff e para o Chuck.»
Apesar dos problemas com drogas, Megadeth ainda era uma banda em ascensão, e as expectativas em torno do próximo álbum eram altas, já que Dave e o braço direito David Ellefson deram início à tarefa de se encontrarem substitutos para os cessantes Jeff e Chuck. O baterista Nick Menza foi o primeiro a ser recrutado – as suas notáveis habilidades e conhecimentos em bateria de jazz adequaram-se perfeitamente aos planos de Dave para o próximo passo da sua banda. Encontrar um novo guitarrista provar-se-ia ser um pouco mais desafiante, principalmente devido aos padrões exactos de Dave.
«Foi difícil, pá», diz Dave. «Estávamos a fazer audições de guitarristas, e todos aqueles gajos entraram e começaram a tocar e foi terrível. Um deles chegou e disse: ‘Tudo bem, estou pronto! Mostra-me só as músicas!’ E eu pensei: ‘Põe-te a andar, caralho!’ Dois dias depois de terminarmos as audições, ouvimos dizer que o gerente do estúdio foi encontrado com a cabeça cortada, morto num contentor de lixo. Graças a Deus, não estávamos lá naquele dia! Então, finalmente, fizemos uma visita à nossa empresa de agenciamento e havia lá uma fita do Marty Friedman. Olhei para aquilo, e ele tinha aquele cabelo colorido maluco e pensei: ‘Que palhaço!’ E não quis saber. Passaram-se alguns meses, eu olhava para aquilo e não queria saber novamente, mas acabei por ouvi-la porque o meu agente estava a ser persistente sobre este gajo. Então, eu ouvi e pensei: ‘Uau, ele quer tocar connosco?’ A partir desse momento, o Marty seria o guitarrista dos Megadeth. Quando o vi tocar a sério, autodestruí-me. Apenas pensei: ‘Oh meu Deus, este gajo é bom e eu sou tão horrível!’»
Antes da chegada de Marty, os Megadeth já tinham começado a trabalhar nas demos de pré-produção, momento em que a deslumbrante precisão técnica e as composições ferozmente inovadoras que acabariam por transformar “Rust in Peace” num inegável marco do metal começaram a ganhar forma. Com reservas, Dave chamou um antigo colega para tocar guitarra nas gravações em bruto.
«Fomos ao EMI Studio e fizemos uma demo do álbum e pedimos ao Chris Poland [guitarrista dos dois primeiros álbuns de Megadeth] para tocar. Pus as faixas demo no re-master do “Rust in Peace” porque queria que as pessoas vissem que o Marty, por melhor que ele seja, foi realmente inspirado por aquilo que o Chris fez nas demos. Já tínhamos composto todo o “Rust in Peace”. De facto, algumas dessas músicas foram compostas muito tempo antes. “Rust in Peace… Polaris” foi uma música que escrevi e que se chamava “Child Saint”, e, na verdade, toquei-a quando estava nos Panic [banda pré-Metallica de Dave].»
Com a formação finalizada e todo o material novo no sítio, o trabalho em “Rust in Peace” começou a ser a sério no final de 1989. Atento ao facto de que a formação anterior tinha atingido o ponto de colapso e desperdiçado o seu potencial, Dave não tinha intenção de permitir que o quarto álbum ficasse aquém das expectativas. E assim se provou: as músicas eram as mais ambiciosas e impressionantes da banda até ao momento, com épicos surpreendentes como “Holy Wars… The Punishment Due” e “Tornado of Souls” a mostrarem um novo nível musical que superava qualquer outra coisa que estava a acontecer no metal naquele momento. Nick e Marty haviam ajudado a transformar a banda numa máquina imparável.
«Foi assim porque estivemos em estúdio a tocar essas músicas durante muito tempo antes de gravarmos», diz Dave. «Foi a repetição, passando por todas as músicas repetidas vezes. Passámos de ter a luminescência de uma vela para sermos um feixe de fotões. Eu queria fazer um disco super-metal, influenciado pelo jazz, e tinha os gajos para fazer isso acontecer. Quando finalmente entrámos em estúdio, foi do tipo: ‘OK, está na hora! Vamos fazer um pouco de magia!’»
O álbum foi gravado no Rumbo Studios, em Canoga Park, Califórnia, propriedade da peculiar dupla da pop Captain And Tennille. Contudo, a escolha do produtor por parte dos Megadeth fazia muito mais sentido. Fresco por ajudar os Guns N’ Roses a conquistarem o planeta com “Appetite for Destruction”, o agora lendário Mike Clink também produziu álbuns de UFO, Heart e Jefferson Starship, e foi um dos gurus de estúdio mais requisitados da época.
«Pedi ao Mike para produzir o disco, principalmente porque eu era um grande fã de UFO e esperava que ele me arranjasse constantemente os tons do Michael Schenker, porque adoro o som da sua guitarra», explica Dave. «Mas o Mike disse: ‘Olha, se o Axl ligar, vou ter que ir embora. Estou a gravar o disco dele ao mesmo tempo que este.’ E eu disse: ‘Não, não estás!’ E isso foi o início do fim da nossa relação. Ele tinha uma cria preta de Labrador que fez um buraco na parede e pôs a minha guitarra ao chão, por isso demitimo-lo a meio do projecto!»
À medida que as sessões de gravação se aproximavam da conclusão, Dave percebeu que, depois de indicar a porta a Mike, precisava de alguém para ajudar nas misturas finais. Entra Max Norman, mestre dos dois primeiros álbuns a solo de Ozzy Osbourne, “Blizzard Of Ozz” e “Diary Of A Madman”.
«Um dos momentos decisivos, quando percebi que o Max era um génio, foi quando sacámos aquele prato de reverberação inversa entre “Rust in Peace” e “Polaris”», conta Dave. «Eu dizia: ‘Sabes que mais? Eu quero algo um pouco parecido com isto [faz um barulho de silvo].’ E o Max disse: ‘Assim?’ E pronto! Feito.»
Ouvindo o imaculado brilho sónico do álbum hoje em dia, parece quase inconcebível que tenha sido gravado há 30 anos. A combinação de Dave, Mike Clink e Max Norman resultou num álbum que elevou a fasquia, tanto em termos de produção como, claro, de musicalidade. Músicas como “Hangar 18”, “Take No Prisoners” e “Poison Was the Cure” não eram de forma alguma inacessíveis. O álbum ofereceu uma mistura desconcertante de tirar o fôlego e ganchos gigantes instantaneamente memoráveis. Com a sua impressionante e icónica capa de Ed Repka e um título brilhante e oportuno, “Rust in Peace” foi perfeito.
«Naquela altura havia a Guerra Fria, russos e americanos estavam a apontar armas nucleares uns contra os outros», rosna Dave. «Vi um autocolante que dizia ‘Que todas as vossas armas enferrujem em paz’, e pensei: ‘É isso! Este é o título do novo álbum!’ O resto do pessoal adorou.»
Lançado em Setembro de 1990, “Rust in Peace” tornou-se rapidamente o álbum mais vendido dos Megadeth, chegando ao 23º lugar nas tabelas de álbuns nos EUA e alcançando o Top 10 no Reino Unido. Continua a ser um clássico reverenciado e é regularmente citado como um dos maiores álbuns de metal de todos os tempos, bem como um dos mais influentes. Podemos ouvir a sua precisão destemida no speed metal mutante de Lamb of God, no ataque metálico de Arch Enemy e até na complexidade esmagadora do material mais pesado de Dream Theater.
Para Dave, mesmo com Megadeth a ter triunfos comerciais ainda maiores por mais um ano ou dois, “Rust in Peace” é o disco que mais se aproxima do coração daquilo que a banda representa, e o seu estatuto como uma das maiores obras-primas do metal é uma fonte de grande orgulho.
«Pôs-nos mesmo no mapa», conclui. «Foi um daqueles discos cruciais e as pessoas começaram realmente a reconhecer a nossa capacidade para tocar, porque quando fizemos o “Peace Sells…” e coisas assim, as pessoas sabiam que conseguíamos tocar, mas não sabiam que conseguíamos tocar tão bem. Este foi um daqueles discos que também ajudou a alimentar a cena do prog metal. Muitas pessoas diziam isso ao longo dos anos, e eu pensava: ‘Estás a falar de quê?’ Mas quando o ouço agora, percebo totalmente. Ouçam os tempos estranhos em “Five Magics”. Acho que começámos muitas dessas coisas. É lisonjeiro para mim, porque consigo ouvir a minha influência no thrash e no speed metal, e acho que também influenciámos outras coisas ao longo do caminho.»
Consultar artigo original em inglês.
Lê a entrevista a Dave Mustaine AQUI.

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