Sepulcros: vazio crónico
Entrevistas 3 de Abril, 2021 Metal Hammer
“Vazio”: que não encerra nada, ausência de conteúdo, falta de algo, sentimento de perda. Este é o significado da palavra per se, mas também vai ao encontro do primeiro álbum dos portugueses Sepulcros, que adicionam ainda a condição da doença mental. Lançado em meados de Março de 2021, o death/doom metal profundo e cavernoso do quinteto tem sido aplaudido um pouco por todo o lado. A Metal Hammer Portugal conversou com o baterista JS sobre medos, sofrimento universal, ignorância, solidão e um segundo álbum no horizonte.
«O pavor da conclusão de que a nossa inteligência não nos levou a lado algum para além da nossa própria destruição.»
JS sobre “Vazio”
Podemos falar do vazio, mas não podemos estar nele senão deixa de o ser. Mas também pode ser sentimental – a falta de algo, a saudade, a ânsia de preencher um espaço esvaziado no nosso âmago. “Invólucro Oco”, “Humana Vacuidade”, a faixa-título… Onde nos inserimos no planeta e no cosmos enquanto humanos que pensam e sentem?
O “Vazio” a que nos referimos é o vazio crónico muito real que é deixado pela pela doença mental. É a conceptualização de algo invisível aos olhos dos outros mas monumental para quem padece dela mesma. É a materialização de uma vida levada a lidar com um buraco do tamanho do universo que nunca desaparecerá. É a depressão que persegue cada passo dado a caminho de uma efémera felicidade.
A título impessoal, é o medo que a raça humana sente do desconhecido, o horror cósmico das consequências de voarmos demasiado perto do sol. O pavor da conclusão de que a nossa inteligência não nos levou a lado algum para além da nossa própria destruição.
Há quem não se sinta deste mundo, do agora, e isso já foi abordado tanto por Hermann Hesse em “Steppenwolf” como pelos saudosos Inverno Eterno. Há nestas músicas de “Vazio” uma, digamos, personagem que exagera a realidade até às emoções mais dilacerantes ou há verdadeiramente uma sinceridade nas letras?
Existe uma sincera representação de angústia vivida por detrás da jornada de “Vazio”. Assim como “Steppenwolf” serviu de invólucro catártico do relato para a queda espiritual de Hesse, também o “Vazio” serve o mesmo propósito para mim. Curioso que serve o mesmo propósito para outros integrantes da banda, e acredito que sirva também para muitos ouvintes. Existe uma certa universalidade no sofrimento, e esta pandemia serviu especialmente para que existisse uma maior compreensão de que todos fazemos parte de uma conexão maior do que nós próprios.
O que é pior: ignorância ou solidão?
Ignorância, sem dúvida. Na solidão, embora seja para muitos um estado de cariz negativo, existe um certo conforto nos seus braços. De uma forma ou de outra, aceitando-se ou não, todos os seres vivos morrerão sozinhos. É algo a que o ser humano não pode escapar.
Já com a ignorância, existem precauções para não se cair nas suas traiçoeiras pisadas, mas, como ser auto-destrutivo que somos, muitos de nós acabam por viver no vício de ignorar o mundo que nos rodeia e o seu funcionamento natural.
«Como ser auto-destrutivo que somos, muitos de nós acabam por viver no vício de ignorar o mundo que nos rodeia e o seu funcionamento natural.»
JS
Parece que nos últimos anos se estão a fechar alguns círculos, indo-se de volta às raízes. O death e doom metal voltaram a ter aquela pestilência sónica que reverteu muitas produções ultra-melódicas e polidas que apareceram algures entre 2000 e 2010. Ainda assim há diferenças para com a primeira metade dos anos 90, porque agora conseguem-se fazer produções cruas com uma certa elegância e perceptividade. Se têm este tipo de produção, parte-se do princípio que é isso que querem e gostam, mas dirias que é este o verdadeiro som do death e doom metal?
Acho que o respeito pelo passado, pelos discos que nos acompanharam, e a necessidade de emular esses discos e bandas tão especiais fizeram com que optássemos por um tipo de som mais claustrofóbico e menos polido. A forma como as bandas soam é também uma importante parte da estética e pode ser utilizada a favor do que a banda pretende apresentar.
Falando em estética sonora, é algo que é muito importante para este tipo de bandas, que vivem muito da criação de atmosferas e paisagens sónicas que remetem o ouvinte para um espaço mental.
Apesar de portugueses que se movimentam no mais profundo underground, com bandas como Summon e Viles Vitae, não são nada estranhos a editoras estrangeiras. Com Sepulcros optaram pela indiana Transcending Obscurity Records, um editora bastante promissora que tem estado em alta. Para aquilo que queriam com Sepulcros, foi a única editora que vos oferecia a projecção que desejavam ou foi, por outro lado, a proposta mais sedutora de todas? Qual a razão desta opção?
Foi a editora que nos pareceu mais em sintonia com a banda e o que ela poderia oferecer se lhe fossem dadas as condições necessárias para exceder as nossas próprias expectativas. Geralmente lançamos os nossos projectos por editoras internacionais, e visto de fora pode parecer algo de muito positivo mas é uma faca de dois gumes – por um lado tem um impacto inicial forte mas, rapidamente, essas editoras esquecem-se da banda e partem para a próxima. Com a Transcending Obscurity existiu um cuidado extra em manter a banda nas bocas do mundo e fazer os possíveis e impossíveis para que tivéssemos o que necessitamos.
Pandemia, vários projectos… É Sepulcros um tiro de uma bala só ou tencionam manter vivo o projecto para futuros lançamentos e quiçá concertos? As boas críticas facilitam tudo, não?
As sementes para o segundo álbum já começam a ser plantadas e sempre foi um projecto que quisemos levar a cabo para além de um álbum só. Ter vários projectos não se torna muito difícil se a gestão do tempo for feita de forma a que tudo possa ter o seu tempo de antena. Se não estivéssemos a enfrentar uma pandemia, muito provavelmente já teríamos tocado ao vivo. Até poderíamos optar por fazer algo no âmbito do live streaming mas isso acabaria por não alinhar com o que a banda pretende. Resta esperar, e assim que exista um pouco mais de liberdade com certeza avançaremos com algo. As boas críticas ajudam a abrir mais portas sem dúvida, e estamos muito gratos por isso – no entanto, mesmo que passássemos despercebidos manteríamos o mesmo modus operandi.
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