Spirit Adrift: «Quis que a música fosse triunfante e poderosa»
Entrevistas 6 de Outubro, 2020 Diogo Ferreira
«O vídeo da “Paranoid” mudou a minha vida!»
Nate Garrett sobre a primeira vez que ouviu Black Sabbath
Com lançamentos consistentes e recipientes de boas críticas, Spirit Adrift é o projecto heavy/doom metal de Nate Garrett com o qual chega ao quarto LP “Enlightened in Eternity”, desta vez com uma ajudinha europeia através da Century Media Records.
Em entrevista à Metal Hammer Portugal, o norte-americano é peremptório sobre a sua nova obra de arte sonora: «“Enlightened in Eternity” é do que mais me orgulho em toda a minha carreira musical. De tudo o que fiz, é a minha cena favorita. Estou mesmo orgulhoso, nunca estive tão orgulhoso de um álbum.»
Mas antes de mergulharmos mais profundamente neste disco, recuemos umas décadas na vida de Nate Garrett para percebermos como é que crescer numa comunidade conservadora esculpiu o homem e o músico. «Muita gente pensa que sou do Arizona», começa. «Nasci e cresci no sul dos EUA, e acho que isso é uma grande parte de quem sou. O sul tem um historial de coisas não muito boas, mas ao mesmo tempo tem das melhores pessoas que já conheci – há uma certa camaradagem, hospitalidade e ética de trabalho, as pessoas são humildes, são ensinadas a deixar a porta aberta, portanto acho que há bons aspectos sobre o sul que muitas pessoas não sabem. Nasci na Florida, que é o lar de muita boa música – Tom Petty, Lynyrd Skynyrd, Blackfoot, até mesmo Morbid Angel e Death –, por isso nasci num Estado muito porreiro. Vivi lá durante pouco tempo e depois mudei-me para o Oklahoma. Cresci numa lugar pequeno cheio de conservadores e cristãos. Foi muito difícil encontrar coisas porreiras, como banda-desenhada, filmes e heavy metal. Felizmente caiu-me tudo no colo. Descobri Black Sabbath a ver o canal VH1 – por alguma razão passaram o vídeo da “Paranoid” e mudou a minha vida! Abriu-se um novo mundo. Por mais fundo que vá no estilo de vida rock n’ roll – com festa, álcool, drogas, comportamento criminoso, violência –, penso que, pelo facto de ter crescido no sul, fui salvo, porque me deu uma fundação, uma educação, e isso ficou comigo. Acho que isso me ajudou a salvar-me da destruição.»
Portanto, questionamos nós: será que ver Black Sabbath na televisão foi a causa para que o jovem Nathan se quisesse tornar numa estrela do rock? «Sim, 100%! Foi instantâneo!», exclama do outro lado da chamada. «As primeiras bandas que me lembro de ouvir, e que me afectaram quando eu era mesmo novo, foram Creedence Clearwater Revival e Lynyrd Skynyrd – ainda gosto muito, ainda são das minhas bandas favoritas. Depois ouvi Jimi Hendrix – fiquei maravilhado, foi o que me fez tocar guitarra, portanto arranjei uma guitarra, mas perdi interesse durante um bocado. Estava a aprender cenas do Jimi Hendrix e fiquei aborrecido, mas quando ouvi Black Sabbath, quando vi como eram, foi instantâneo – foi do tipo: ‘É isto que vou fazer! Vou dedicar a minha vida a tentar ser tão fixe como estes gajos!’»
Actualmente a passar por um bom e positivo momento na vida, nem sempre o seu caminho foi iluminado por brilhantes candeeiros, cruzando assim ruas escuras empestadas de álcool, violência e depressão. Todavia, a música ajudou o norte-americano a encontrar uma saída – Nate abre-se à Metal Hammer Portugal: «Sempre ajudou, mesmo quando era muito novo, quando ouvi Black Sabbath – isso deu-me a sensação de que não estava sozinho, que havia um propósito para a minha vida e que havia pessoas que se sentiam como eu. Por toda a minha vida, quando passo por momentos difíceis, a música ajuda-me. Música country, Hank Williams. Ao cresceres, se tiveres problemas com uma rapariga, se ouvires Hank Williams sabes que não estás sozinho. Ele passou pelas mesmas coisas. Quando bebia muito, ouvia o “World Coming Down”, dos Type O Negative, todos os dias – esse álbum salvou-me a vida. Ao conseguir uma mente limpa e ficar saudável outra vez – emocional e fisicamente –, o meu objectivo é fazer música que consiga ajudar os outros e a mim, tal como as minhas bandas favoritas fizeram comigo. Quero que as pessoas se sintam bem! É isso!»
«Quando bebia muito, ouvia o “World Coming Down”, dos Type O Negative, todos os dias – esse álbum salvou-me a vida.»
Nate Garrett
De facto, basta lermos o título “Enlightened in Eternity” para percebermos o rumo de Nate, sendo mesmo o oposto de trabalhos anteriores como “Curse of Conception” (2017) e “Divided by Darkness” (2019). Sempre calmo e simpático, o músico não tem problemas em falar sobre as tormentas do passado e como isso o levou a criar certos álbuns. «“Curse of Conception” era sobre conceitos muito pesados, muita dor na minha vida, cenas pessoais muito profundas que me estavam a acontecer. “Divided by Darkness” foi mais sobre dor, trauma, violência, raiva e negativismo num sentido geral. Examinei o lado negro da humanidade e como nos lixamos uns aos outros. Nos EUA está-se muito mau neste momento, e é por causa do lado negro da humanidade. Coloquei-me em situações muito desafiantes para ambos os álbuns. Examinei cenas duras e difíceis. Em “Divided by Darkness” fui ainda mais longe – tocava guitarra 12 horas por dia, corria todos os dias até vomitar, deixei de fumar para cantar melhor. Corria para melhorar os pulmões, para cantar melhor, mas ao mesmo tempo fazia-o para me torturar, só para pôr a minha cabeça no sítio certo, para fazer um álbum tão negro e negativo.»
Num ano tão horrível como 2020, Nate Garrett optou por modificar completamente o conceito da sua arte. Num disco que soa como se Black Sabbath se unisse a Angel Witch, mas sempre com uma pitada de hard-rock norte-americano e a assinatura própria de Spirit Adrift, as letras versam sobre a descoberta pessoal rumo a uma vida melhor, sobre a iluminação das escuras profundezas onde os segredos são mantidos e sobre a perseverança de nunca duvidares daquilo que podes alcançar se te mantiveres livre. «Quando comecei a trabalhar no “Enlightened in Eternity” disse a mim mesmo que não ia fazer aquilo novamente», esclarece. «Sempre que faço um álbum, quero que as pessoas saibam que isso rouba-me a vida toda durante um ano, às vezes dois anos – é só nisso que penso, é tudo o que faço. Podes perguntar à minha esposa – mesmo quando estou em casa, quando não estou em digressão, sou um fantasma, não estou completamente presente porque fixo-me no álbum em que estou a trabalhar. Penso em todos os aspectos a toda a hora. Eu nem queria fazer um novo álbum, mas sempre que pegava na guitarra, sacava uns riffs porreiros, portanto eu disse: ‘Bem, se vou fazer isto, não quero estar miserável e deprimido por mais um ano ou dois como estive com os dois últimos álbuns!’ [risos] Eu disse: ‘A única forma de fazer isto é se eu desfrutar!’ Quis ser divertido, quis que a música fosse triunfante e poderosa. Todas as bandas metal têm essa qualidade de vida: elevação e derrota dos teus oponentes. Pensa em Dio, que é todo sobre matar o dragão – é uma metáfora para emancipação. “Screaming for Vengeance” dos Judas Priest , álbuns de Iron Maiden, mesmo “Sabbath Bloody Sabbath” [Black Sabbath] – é tudo sobre tomares as rédeas da tua vida e triunfar perante adversidade, destruir todos os desafios à tua frente, sentires-te bem. Queria fazer um álbum assim, para ter um bom momento a fazê-lo. Estou muito contente por tê-lo feito, porque este é o meu favorito. Passei um bom bocado a compor este álbum, isso é certo.»
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“Enlightened in Eternity” tem data de lançamento a 16 de Outubro de 2020.

Metal Hammer Portugal
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