Pusemos o vocalista dos Cradle of Filth, Dani Filth, e a estrela de “Hellraiser”, Doug Bradley, numa sala para conversarem sobre terror, metal e...

Pusemos o vocalista dos Cradle of Filth, Dani Filth, e a estrela de “Hellraiser”, Doug Bradley, numa sala para conversarem sobre terror, metal e esqueletos debaixo do soalho.

Como o vilão Pinhead de “Hellraiser”, Doug Bradley personifica um dos personagens mais icónicos do terror. Dani Filth conhece bem o actor, tendo trabalhado com ele em vários álbuns de Cradle of Filth ao longo dos anos. Portanto, talvez não devêssemos ficar muito surpreendidos que, ao reuni-los para uma conversa especial sobre terror e metal, dificilmente os conseguiríamos calar… Não que o quiséssemos.

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Dani: Pinhead é um ícone do terror. Por que é que tem sido um personagem tão duradouro?

Doug: Oh, Jesus! Quanto mais me perguntam isso, menos tenho a certeza de que sei a resposta. Talvez seja simplesmente por andar por cá há muito tempo. Milhões de pessoas que nunca viram o filme conhecem a imagem. A imagem aparece, como Frankenstein, Dracula, Wolf Man – ganha vida própria e torna-se parte da cultura. Tenho um recorte de uma entrevista do Sunday Times com Alice Cooper e, na foto que a acompanha, ele tem uma camisola do Pinhead! Podes pô-lo no mesmo grupo de Freddy, Jason e Leatherface, mas Pinhead é excepcional. É uma imagem extraordinária, muito difícil, desarmante – chama a atenção.

Dani: Vi uma estátua de uma Pinhead feminina no outro dia, da Sideshow Collectibles. Parecias bem!

Doug: Agora sou transgénero! Certamente, houve sempre muitas ambiguidades sobre o Pinhead. Não esqueçamos que ele usa saia…

Dani: Lembras-te da primeira vez em que trabalhámos juntos?

Doug: Tenho uma memória do tempo em que estavas a fazer o filme “Cradle Of Fear”, sentado contigo e com o realizador num bar em Camden Town. Tinhas feito o “Cruelty and the Beast” com a Ingrid [Pitt, famosa actriz de terror que narrou o álbum de 1998], e gostei da tua escrita. Aqui devo abordar algo: sou uma grande decepção para a grande maioria dos meus fãs porque não papo heavy metal! Mas sempre fui atraído pelas imagens e gostei do que sabia sobre a escrita do Dani. Recebi uma chamada da agente da banda. Ela disse que a banda estava a dar os toques finais no álbum e o Dani imaginou se eu incluiria algum spoken-word. Ela disse: ‘Não temos muito dinheiro…’

Dani: Ah ah ah!

Doug: Perguntei quanto tinham, e ela estava absolutamente certa! Mas pensei: ‘Que se lixe.’ Era algo totalmente diferente na minha carreira, parecia intrigante, por isso fui para o estúdio e fizemos aquela gravação para o “Midian”.

Dani: Penso que… Não, sei que te deixámos embaraçado porque, quando apareceste, estavam lá todos com as suas coisas do Pinhead, e disseste: ‘Oh, Cristo, outra vez não.’ Trabalhaste em algumas outras coisas depois disso: “Thornography”, “Nymphetamine”, “Godspeed…”, que gravámos em minha casa.

Doug: Lembro-me de que tinhas um esqueleto debaixo do chão da tua cozinha…

Dani: Isso mesmo! Infelizmente, levantou-se e fugiu. Tivemos um canalizador dos fracos que o fez emergir, portanto agora está no meu suporte de microfone. Ora, trabalhámos juntos em algumas ocasiões e podemos muito bem trabalhar novamente…

Doug: Nunca mais ouvi falar de ti depois disso. Nunca escreves, nunca ligas, nunca mandas flores no meu aniversário… Lembro-me de sair daquela primeira sessão para o “Midian” e implorar para se fazer algo em 4/4! Para tentar chegar a algum lado fora de ritmo em 17/25 ou lá o que era…

Dani: Isso sempre funcionou com actores. Têm aquela cadência natural em que conseguem falar por cima de qualquer coisa, assim como a Ingrid antes de ti. Os dois não demoraram muito, mas encaixou-se perfeitamente. E fomos muito atrevidos com o “Midian” ao colocarmos um ‘Oh, no tears, please’. É uma linha tão icónica, não é?

Doug: É. Tive muita sorte. Tive falas tremendas nos primeiros quatro filmes.

Dani: Mas a associação com o “Midian”, na verdade, veio do teu papel como Lylesberg no “Nightbreed” [1990, de Clive Barker]. Continuo a pensar em obter a versão longa…

Doug: A “The Cabal Cut”? Recomendo – redefine o filme o mais próximo possível daquilo que rodámos antes da Fox f*der tudo. O filme, lançado na época, era uma caricatura do que deveria ter sido, [foi] efectivamente destruído pela Fox na sua infinita sabedoria – a única coisa que eles não conseguiam entender era que os monstros eram os bons. Às vezes era um pandemónio – muitos actores precisavam de maquilhagem protética, e isso não se faz rapidamente. Apenas para fazer toda a maquilhagem à hora certa era bastante caótico.

Dani: Como foi trabalhar com a Blackcraft Wrestling?

Doug: Eu sempre disse que a maldição e a diversão de ser actor é nunca saber o que vem a seguir, e certamente nunca teria previsto isso. Tenho um relacionamento com a Blackcraft há alguns anos – fiz camisolas, ajudei a promover o uísque deles. O gajo principal entrou em contacto comigo do nada, a dizer que queria lançar a Blackcraft Wrestling e que me queria envolvido. Tão fora de mão que nem sabia por onde começar, mas disse que sim e tudo aconteceu muito rapidamente.

Dani: Eras o ringmaster?

Doug: Fazia de MC até certo ponto. Eu estava com muito, muito medo de abordar o espectáculo ao vivo. Não tinha mapa e bússola para isso. Estar no palco com um guião aprendido ou num set de filmagens, tudo bem, eu sei o que estou a fazer, mas nunca tinha tido uma experiência daquele tipo.

Dani: O wrestling da Blackcraft é menos ‘encenado’ e mais violento?

Doug: A primeira luta que apresentei foi uma ladder match – eu estava vagamente ciente do que isso implicaria! Há um cálice pendurado acima do ringue e quatro lutadores. Um deles tem que subir a escada e pegar no cálice em primeiro, e isso foi uma loucura. É insano. Batiam uns nos outras com escadas – escadas a sério, grandes. Não são de borracha, garanto-te. Se arremessares um ser humano pelo ringue e cair numa escada, não dá para fingir! Está a acontecer! Quando voltei ao ringue, estava perante um gajo com sangue a escorrer pela cara e torso. Inicialmente eu estava bastante tranquilo com isso – estou habituado a estar perto de pessoas cobertas de sangue –, mas então uma vozinha disse: ‘Ah, sim, mas isto não é falso.’ Esta foi a minha entrada na Blackcraft Wrestling. Tiveram os Falling In Reverse a tocar ao vivo no final da noite.

Dani: Disseste que não és muito metaleiro. Que música ouves?

Doug: No final dos anos 60, eu gostava muito de rock com influência de blues. Era um grande fã de Cream, adorava o início de Led Zeppelin, o meu primeiro concerto foi Deep Purple por altura do “In Rock”. Então, quando 1977 aconteceu, os The Clash entraram na minha vida – provavelmente a minha segunda banda favorita de todos os tempos – e tudo o que veio depois: The Jam, The Damned, The Stranglers, Echo And The Bunnymen… Mas continuo a ouvir músicas novas, e sou um grande fã de – e sei que isto é polémico porque sei de algumas pessoas que torcem o nariz e dizem ‘eles não são metal!’ – Ghost.

Dani: Oh! Vi-os no Royal Albert Hall!

Doug: É uma grande cena tocar no Albert Hall, e é excelente que tenhas lá estado, Dani. O último álbum [“Prequelle”] é maravilhoso, há algumas faixas que parecem ter saído de “Les Miserables” ou algo assim. Conheci-os numa convenção chamada Texas Frightmare Weekend, em Dallas. Os Ghost estavam a tocar em Dallas naquela noite e vieram para a convenção mesmo como Papa and the Nameless Ghouls, e parou tudo! Aproximaram-se da minha mesa, foi muito desconcertante. Vi como eles eram e, para ser sincero, pensei: ‘Já estou a ver como soam! Soam do tipo – [Doug imita um cão a vomitar], portanto não quero saber!’ Mas eles ficaram à minha volta, atrás da minha mesa, e estavam a falar comigo em voz baixa através das máscaras. Fomos vê-los naquela noite e fiquei impressionado. O meu único arrependimento é que fomos para a entrada, para falar com o gajo do merch, e perdemos a versão de “Here Comes the Sun”.

Dani: Lembro-me de uma memória encantadora. Na terceira vez que trabalhámos juntos, tinhas feito um anúncio para um banco ou algo assim. Eu disse-te: ‘No outro dia vi a tua cara na lateral de um autocarro.’ Apenas te viraste para mim e disseste: ‘Oh, vai-te f*der!’ Na verdade, eu estava na cama – olhei pela janela e lá estavas, a encarar-me, foi surreal!

Metal Hammer: Voltando ao terror por um segundo, meus amigos: há algum filme em particular através do qual se tenham unido?

Doug: Acho que nunca tivemos essa conversa, pois não? Bem, o meu filme de terror favorito de todos os tempos é “The Bride of Frankenstein” [1935].

Dani: Com certeza. Sou um grande fã da Universal. Agora começaram a refazê-los, mas não sei se isso é uma coisa boa. O primeiro, “Dracula Untold”, era promissor, até que começou a transformar-se num bando de morcegos e a ficar um pouco caricato. Estão a refazer o “The Bride of Frankenstein”. Acho que ouvi dizer que será a Angelina Jolie – o que achas disso?

Doug: [suga o ar com força, de dentes cerrados] Não muito.

Dani: O meu filme favorito é o “Night of the Demon”, baseado no “Casting the Runes” de MR James. Mesmo que tenham mostrado aquele grande demónio foleiro no início e no fim. Mas ainda assim, um filme absolutamente brilhante.

Doug: Concordo completamente. Assustei-me muito quando o vi na TV – lembro-me.

Dani: Então, fazes planos para o Halloween?

Doug: Não. Para gente como tu e eu, réprobos que somos, é Halloween todos os dias. Para ser completamente honesto, no ano passado sentei-me na minha varanda e distribuí doces. Quão assustador é isso?!

Dani: Devias fazê-lo todo trajado! Mas não é o tipo de coisa que vestes, pois não?

Doug: Não é fácil nem bem, não.

Dani: Não sem uma bebedeira decente, pelo menos!

Consultar artigo original em inglês.

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