Culted “Nous”
Reviews 1 de Março, 2021 Metal Hammer
Editora: Season of Mist
Data de lançamento: 26.02.2021
Género: blackened industrial doom
Nota: 4.5/5
O protagonismo sónico reflecte a forma como os diversos instrumentos são metamorfoseados pelos múltiplos efeitos dispostos em estratos num caos organizado.
A primeira colaboração dos canadianos Matthew Friesen, Michael Klassen (ambos com funções na guitarra, baixo, teclados, percussão, noise) e Kevin Stevenson (bateria) com o sueco Daniel Jansson (voz, ambiências) ficou registada no LP “Below the Thunders of the Upper Deep” (2009) e no EP “Of Death and Ritual” (2010). Os Culted andam há mais de dez anos nestas missas, mas a discografia é curta – não lançavam um álbum desde “Oblique to All Paths” (2014). A Season of Mist abriu-lhes as portas para a remessa de novos temas que nos infernizam durante uma hora e tal de culto ruidoso, num registo minimalista, down-tempo e pesado q.b..
“Nous” divide-se em dez faixas com a duração média de 6’30”, que exigem tempo e disponibilidade. O álbum é de um gajo se perder, atentando aos pormenores – não entra à primeira, nem à segunda, nem à terceira. Ao primeiro impacto percebe-se de imediato uma nuvem de ruído áspero e impenetrável. A sensação não é boa – é confusa e enigmática. É preciso escavar e ultrapassar a rugosidade dos diferentes estratos dos efeitos sónicos sobrepostos, para descer ao fundo desta construção cavernosa numa experiência imersiva. Os álbuns que perduram, primeiro estranham-se, depois entranham-se. Este é dos tais cujo mistério não se esgota nas primeiras audições. Para melhor esclarecer, é começar pelo fim – “Crush My Soul” –, o original dos Godflesh retirado do álbum “Selfless” (1994) que os Culted conseguiram estender até uns bem medidos 8’41”.
Desta linha para a frente só avançam curiosos e conhecedores interessados. “Nous” começa em “Lowest Class”. Após uma introdução com um advogado do yoga e de outras causas transcendentais que recomenda fechar os olhos e relaxar, entra o homem da fala dos Culted com berro e bafo de Lemmy – “This life in ruin, this soul covered in dirt”. Mais à frente, outros versos batem a mesma tecla sobre um registo doom-sludge-noise monocromático: “We fall endlessly in the vacuum (…) We are the lowest class, titans of the endless void”. E por fim: “We are the lowest class / You will never see us sober”.
A base instrumental sobre a qual decorre o discurso é um devaneio metaleiro numa extensão pantanosa de sete minutos e tal empastados numa amálgama que cruza noise, doom e industrial.
“Lifers”, que é groovy e rockambolesco, diz assim: “No need for spikes or leather, boasting two middle fingers / In a dog world we better bite than bark”. Numa de sludge industrializado e duas de doom inominável, é xarope do bom. Em terceiro lugar, “One Last Smoke” espalha o nevoeiro negro e opiáceo por entre as brumas do doom e blackgaze, enquanto defende à letra “buildings rise to end the skyline / rusted are the wheels of the machine”. A distorção é presença constante ao longo do álbum. “Ankle Deep” entra a seguir, de mansinho, melancólico e minimalista, num registo semi-acústico de teclados e guitarras com passagem a injeções de fuzz, psicadelismo e batida industrial com amplificação redobrada – “On your knees you don’t look that tall / At the foot of the mountain we never shiver (…) I take no judgements from the likes of you”. O vento vira a meio e a calmaria passa a distorção ciclónica. “Black Bird” acompanha a fórmula anterior, e chega a ser comovente quando o homem da fala dispara “poison the blood to clear the mind”, ou, quando a meio da alucinação instalada, o das teclas atira com umas linhas melódicas em regime acústico pelo meio do noise caótico num disparo sónico apontado a Mogwai.
Tanto “Opiate the Hounds”, “Maze”, “Crown of Lies” e “The Grid” prosseguem na linha da poética niilista e depressiva comum à temática dos primeiros temas. A segunda metade do álbum repete a essência melancólica de “Nous”, que consiste na construção de atmosferas abstractas num ambiente de horror – não nos cenários do terror ficcionado mas num clima de horror existencial. O protagonismo sónico reflecte a forma como os diversos instrumentos, incluindo a voz e os elementos acústicos, são metamorfoseados pelos múltiplos efeitos dispostos em estratos num caos organizado. Para isso contribuiu também John Golden (Neurosis, Melvins, Sonic Youth), o engenheiro de som a cargo da masterização.
“Nous” é um disco de cabeceira, um álbum de bolso. Heavy-Maria, cheia de graça, rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte. Além!
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