Com o álbum “Slaughter of the Soul”, de 1995, os suecos At the Gates abriram um novo caminho ao metal.

Com o álbum “Slaughter of the Soul”, de 1995, os suecos At the Gates abriram um novo caminho ao metal.

8 de Maio de 2008. Os At the Gates sobem ao palco em Osaka, Japão. É a primeira vez que tocam no país – e o primeiro concerto desde a separação, 12 anos antes. Abrem com a faixa-título do quarto álbum, “Slaughter of the Soul”, que começa com um riff agitado e desconexo, que pára de repente, antes do vocalista Tomas ‘Tompa’ Lindberg berrar um feroz ‘Go!’.

Em Osaka, onde a interacção do público está longe de ser garantida, toda a gente grita com ele. Tal coisa, pensou o baixista Jonas Björler na altura, nunca tinha acontecido.

«Quando nos reunimos em 2008, esses concertos foram incríveis», diz Jonas. «Essa foi realmente a melhor resposta que já tivemos. Ficámos arrepiados. Foi impressionante ver o quanto as pessoas adoravam as músicas que tínhamos escrito há anos. Mas aconteceu tudo de boca a boca quando estávamos ocupados a fazer outras coisas. Não podes reclamar por fazeres um disco que as pessoas dizem que é um clássico. Mas o hype só começou dois anos depois de nos separarmos!»

“Slaughter of the Soul” está agora firmemente estabelecido como um dos álbuns de metal mais influentes lançados durante os anos 1990. O chamado ‘som de Gotemburgo’ tornou-se uma parte tão omnipresente no vocabulário sonoro do metal moderno que poucos contestariam o status dos At the Gates como pioneiros.

No início dos anos 1990, no entanto, os suecos eram simplesmente uma das muitas bandas aspirantes no death metal underground e exibiam um alegre desinteresse pelo apelo de massas. Quando gravaram o EP de estreia, “Gardens of Grief”, tocavam os seus instrumentos há apenas um ano, e embora os encardidos primeiros álbuns, como “With Fear I Kiss the Burning Darkness”, de 1993, tenham sempre os seus defensores, davam evidências escassas de que a banda estava prestes a transformar-se numa máquina afiada e revolucionária.

Tudo mudou após a saída do guitarrista original Alf Svensson em 1993, e a passagem da responsabilidade de compositor para o outro homem das seis cordas, Anders Björler, irmão gémeo de Jonas, aquando do terceiro álbum “Terminal Spirit Disease”.

«O Alf costumava trazer coisas realmente estranhas e distorcidas», recorda o baixista. «Mas depois o Anders assumiu a composição, ou pelo menos 90% dela. Deu para se ouvir algumas novas influências imediatamente. No“Terminal Spirit Disease” havia algumas estruturas musicais mais fáceis, e sentimos naquele momento que sabíamos o caminho que íamos seguir. O material antigo era porreiro, mas queríamos mesmo tornar o nosso som mais acessível. Queríamos escrever êxitos de death metal! [risos]»

Gravado no início de 1995 no Studio Fredman, em Gotemburgo, e supervisionado pelo famoso produtor Fredrik Nordström, “Slaughter of the Soul” foi o primeiro álbum de At the Gates com a nova editora Earache Records, lar de muitas das bandas favoritas dos suecos, incluindo Morbid Angel e Carcass. Assinar com a Earache foi, sem dúvida, um passo comercial para Jonas e seus companheiros de banda, mas não sentiram pressão para fazer um tipo particular de álbum metal.

«Aquelas músicas, aqueles riffs, aquelas performances – foi tudo apenas uma grande coincidência», sorri Jonas. «Tenho a certeza de que não tínhamos um plano. Acho que todos progredimos como músicos, mas ainda éramos muito inexperientes no estúdio. A verdade é que estávamos a compor músicas mais fáceis, e é muito mais fácil que soe firme quando as músicas são mais simples!»

O único membro de ATG que não passou um período fácil durante o processo de gravação foi o baterista Adrian Erlandsson.

«Quando o Adrian gravou a bateria para [a abertura do álbum] “Blinded By Fear”, teve um sério sangramento nasal. Tinha estado a trabalhar 12 horas na floresta, a cortar árvores e outras coisas. Portanto, foi uma gravação difícil para ele. Ele era o único com um emprego externo! Mas quando és um baterista de metal sueco, tens de cortar árvores para fazer as próprias baquetas! [risos]»

Dada a sua reputação hoje em dia, é perdoável supor que “Slaughter of the Soul” foi um sucesso instantâneo aquando do seu lançamento em Novembro de 1995. No entanto, apesar das críticas elogiosas na imprensa metal e do perfil aprimorado parcialmente fornecido pela mudança para a Earache, o mundo do metal nos meados dos anos 1990 ainda não estava pronto para proclamar o álbum como uma obra-prima que definiu uma era. Pior, a banda estava prestes a desmoronar antes mesmo de descolar.

«A reacção não foi instantânea», suspira Jonas. «Tivemos uma boa imprensa, claro, e muitos jornalistas adoraram o álbum desde o primeiro dia, mas não conseguimos atrair os fãs imediatamente. Não fizemos nenhuma digressão como cabeças-de-cartaz. Eventualmente, começámos a receber ofertas para coisas como cabeças-de-cartaz, mas o Anders saiu da banda. Estávamos na estrada há cinco meses seguidos e ele estava simplesmente exausto. Não foi uma boa situação e estávamos todos chateados com isso, mas foi assim.»

Como resultado da separação prematura, os At the Gates destacaram-se pela sua ausência, já que “Slaughter of the Soul” começou a exercer o seu fascínio na crescente cena metal do Séc. XXI, especialmente nos Estados Unidos, onde bandas como Killswitch Engage, Trivium e The Black Dahlia Murder não escondiam o seu amor pelo álbum e a sua dívida para com o seu som revolucionário.

«Absolutamente, Trivium não existiria sem “Slaughter of the Soul”», diz o vocalista Matt Heafy. «Foi um álbum inovador e foi uma influência directa na música que os Trivium fizeram ao longo dos anos, e ainda hoje, e também tem sido uma influência indirecta em muitas das nossas outras bandas favoritas.»

Essa nova geração de miúdos do metal teve a hipótese de ver o que estava a acontecer quando os At the Gates voltaram em 2008. Inicialmente, era para ser apenas uma digressão de Verão.

«Com o passar dos anos, começámos a comunicar muito com fãs que nunca nos viram tocar durante primeira vez, porque tinham apenas oito ou nove anos em 1996», observa Jonas. «Cresceu de boca a boca e, eventualmente, tornou-se óbvio que muitas pessoas estavam interessadas em ver-nos tocar. Quando nos reunimos em 2008, era apenas um plano simples para aquele Verão e nada mais, mas foi tão divertido que pensámos em continuar. Dar às pessoas o que elas querem, certo?»

Anos depois de voltarem à acção, Jonas e os colegas mais do que recuperaram o tempo perdido. Desde a reunião, fizeram álbuns como “At War with Reality” (2014) e “To Drink from the Night Itself” (2018) – os mestres do melo-death estão orgulhosos, mas ligeiramente confusos com o seu impacto no mundo do metal.

«De alguma forma, aquele álbum causou uma profunda impressão nas pessoas, a algum nível psicológico», conclui Jonas. «Sentas-te no quarto e escreves riffs e o que sair sai, sabes? Mas é um excelente álbum, e se as pessoas ainda tiverem fortes sentimentos por ele, vamos pegar nisso!»

Cabe a Matt Heafy, o estudante de sempre das porcas e parafusos da música pesada, explicar como e por que é que os At the Gates mudaram tudo com “Slaughter of the Soul”.

«Esse álbum pode ser vicioso, intenso e brutal, mas oferece essa intensidade enquanto está envolto em melodias cativantes e sombrias. O bonito que essas bandas de metal suecas trouxeram à cena global passa por transformar as melodias que outras bandas tocariam como linhas de guitarra solo, como os Iron Maiden fazem, em linhas de guitarra base. At the Gates é uma banda cujos riffs podes cantarolar! É por isso que acho que o “Slaughter of the Soul” é uma parte essencial do vocabulário de qualquer músico de metal a sério.»

Consultar artigo original em inglês.

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