Em Março de 2007, a Metal Hammer conversou com Peter Steele sobre o novo álbum dos Type O Negative, “Dead Again”....

Em Março de 2007, a Metal Hammer conversou com Peter Steele sobre o novo álbum dos Type O Negative, “Dead Again”. Ninguém sabia que seria o seu canto do cisne.

A 13 de Maio de 2005, o mundo da música pesada foi abalado por rumores de que o vocalista, baixista e fundador dos Type O Negative, Pete Steele, tinha morrido. A única pista quanto à veracidade das notícias era uma imagem enigmática partilhada no site oficial da banda: uma lápide ilustrada que dizia “Peter Steele, 1962-2005”. Para qualquer pessoa que soubesse alguma coisa sobre Pete Steele ou a sua música, o epitáfio discreto dizia tudo. Dizia simplesmente: “Free at last” [“Finalmente livre”]. Era um posfácio tragicamente adequado para uma existência celebremente melancólica. Claro, Pete Steele era um visionário musical cuja marca barítona e humor negro fundiam uma linguagem de amor e perda com sons góticos e algo à Sabbath, criando-se uma das bandas metal mais bem-sucedidas e inimitáveis dos 1990s. Mas a vida de Pete Steele também foi atormentada por perdas pessoais, crises de depressão severa e uma perspectiva tão exuberantemente livre de qualquer tipo de optimismo que tudo o que alguém realmente podia fazer era rir. Não por ser ridículo, mas por se concordar que não perdeste tudo se ainda tiveres sentido de humor.

A notícia teve os seus presságios sepulcrais. A digressão de Outono de 2004 dos Type O Negative tinha sido cancelada devido a um diagnóstico médico que revelou certas anomalias na saúde de Steele, de acordo com um comunicado divulgado pela agência da banda. Por isso, foi um alívio quando o baterista Johnny Kelley declarou em Fevereiro de 2005 que «realmente não há muito a relatar para além de que ele está bem e a sua saúde está melhorar diariamente». Mas de repente parecia que o homem das baquetas tinha falado cedo demais e o mundo do metal tinha ficado com o último álbum de Type O Negative para dar sentido à perda, o apropriadamente intitulado “Life Is Killing Me” de 2003. Estranhamente, parecia prever a morte ostensivamente sombria do seu criador com músicas como “I Don’t Wanna Be Me” e “The Dream Is Dead”.

«Aah, aquilo foi uma treta», ri Steele no seu sotaque do Brooklyn. «A digressão foi cancelada por problemas internos na banda. Não seria correcto entrar nisso por causa da minha relação com os rapazes. Não foi culpa minha, mas alguém teve de inventar uma desculpa. Claro, sendo o maior membro da banda, eu era o maior alvo, e depois começo a receber e-mails como ‘espero que melhores’, e quando foi divulgado que estava vivo, era mais ‘espero que morras, idiota’.»

Como Steele conta, a lápide era uma brincadeira do teclista Josh Silver para anunciar o fim do relacionamento dos Type O Negative com a editora de longa data Roadrunner Records e a subsequente assinatura com a SPV («eles sempre nos trataram justamente, mas a amizade não paga as contas», diz sobre a mudança). O problema? A ideia original de Silver era retratar quatro lápides – uma para cada membro da banda que também é conhecida como The Drab Four. Steele não sabe explicar por que é que só a sua lápide foi usada, e nem toda a gente achou graça. Entre eles estava um juiz que Steele era legalmente obrigado a ver de vez em quando devido ao que descreve como «problemas legais».

«Acontece que ele é fã de Type O Negative e mandou a polícia à minha casa, para verificarem se eu estava morto ou não», diz Steele a rir. «Eu disse ao Josh: ‘Pá, não tens noção do que acabaste de fazer – acabaste de chatear o Supremo Tribunal de Nova Iorque! Eu também acho engraçado como o caralho, mas diz-me antes que o voltes a fazer!’ E depois o juiz disse: ‘Achas que isto é engraçado?’ Tive de invocar a Quinta [Emenda]», ri.

É um raro momento de leviandade numa conversa que frequentemente conduz à melancolia, ao desgosto e aos contos de perda que acompanham a música de Type O Negative desde o lançamento do seu álbum de estreia “Slow Deep and Hard” (1991), um relato autobiográfico dos romances falhados de Steele que escureceu o mundo com seus desobstruídos lamentos fúnebres. Quanto aos problemas legais que mencionou, parece que a sorte de Steele não mudou.

«Tive uma altercação…», diz, «por causa duma mulher, claro. Como qualquer pessoa com QI te dirá, as mulheres são a base de todas as guerras na porra da Terra. Só os homens começam guerras, e sabes por quê? Porque querem mais terra e mais dinheiro, porque quando tens mais poder, tens mais mulheres. Talvez pareça sexista, mas eu sou sexista, ok? Detesto homens. Detesto competição. Adoro mulheres. Venho duma família com cinco tias, cinco irmãs e cinco sobrinhas. Sabes que mais? Adoro. Sou este pequeno pedaço de testosterona a flutuar num mar de estrogénio».

Mas talvez Steele esteja a exagerar um pouco em defesa da felicidade. Como confessa, mesmo o sexto trabalho dos Type O Negative, o álbum “Dead Again”, continua a demonstrar a sua extrema decepção sobre, bem… praticamente tudo. Tinha acabado de celebrar as festividades de Natal, sem esquecer o seu 45º aniversário a 4 de Janeiro. Feliz aniversário, Pete. «Sim, obrigado», diz. «O 45º aniversário de ter sido expulso do melhor lugar onde já morei. Tinha piscina coberta, comida de borla…»

Na sua morada no Brooklyn – na cave da casa dos pais, para onde mandou um colchão escada abaixo e nunca mais olhou para trás quando tinha 19 anos –, Steele vê as notícias sem grande atenção como diz que faz todas as manhãs, «para ver se algum membro da família foi assassinado», comenta sem ironia. «Depois destas últimas festividades, espero que sim, caralho. Estou a ter alguns problemas familiares. A minha mãe faleceu, o que não é grande coisa para mim, mas este é realmente o primeiro ano em que senti o impacto da sua partida.»

É a maneira prática com que revela uma perda tão tremenda que diz tudo sobre o distanciamento entorpecido com que Steele aceita tal tragédia na sua vida. A sua mãe morreu em 2005, mas Peter confessa que ainda estava em estado de choque e em devastação suprema no final do ano, e foi só depois de 2006 que encarou a sua perda pela primeira vez.

«A minha mãe mantinha a família unida», diz Steele, com o apressado ritmo nova iorquino a diminuir um pouco. «Detesto soar positivo, mas tento concentrar-me não no amor que foi perdido mas no amor que foi conquistado. Todas as minhas irmãs e sobrinhas… Apenas tento transferir. Desde que ela morreu, houve alguma dissensão e desmoronamento. Gosto de dizer que o sangue é mais espesso do que a água, mas é mais difícil de limpar.»

Uma das maneiras com que Steele lidou com isso foi decidir reunir a sua banda pré-Type O Negative dos 80s, os Carnivore, para dar alguns concertos nos EUA, mais algumas participações em festivais europeus. Muito longe do rugido das guitarras e dos lamentos fúnebres de Type O Negative, Carnivore era uma roupagem formada a partir das ruínas da banda anterior de Steele, os Fallout. Os seus dois lançamentos – a estreia homónima em 1985 e “Retaliation” de 1987 – dificilmente foram grandes sucessos e os Carnivore separar-se-iam em breve, fazendo com que Steele formasse Subzero em 1989 após um período de dois anos a trabalhar para o Departamento de Parques da Cidade de Nova Iorque. Os Subzero seriam renomeados para Type O Negative. Não demorou muito para que a nova banda de Steele lançasse o segundo álbum “Bloody Kisses” em 1991. Sucessor do controversamente misantrópico “Slow Deep and Hard” de 1991, “…Kisses” alcançaria platina, catapultaria a Roadrunner para um grande momento e tornaria Type O Negative um nome familiar do metal por altura do lançamento do magnum opus “October Rust” (1996). Isto é suficiente para se perguntar por que é que Steele investiu na reunião de Carnivore e não em Type O Negative.

«Os outros rapazes em Type O são casados e têm filhos», explica Steele. «Não sou casado e não tenho filhos – pelo menos acho que não –, portanto tenho muito mais tempo. Não quero estar parado, por isso entrei em contacto com esses amigos de há muitos anos para ver se eles queriam fazer Carnivore por diversão e dinheiro – ênfase na diversão.»

Por que não simplesmente reunir as tropas e seguir em frente com Type O Negative?

«Olha, estou mesmo chateado por ter 45 anos», diz Steele, sem deixar dúvidas quanto ao seu desânimo com o desenvolvimento. «Sou como um velho a fazer a sua última birra de merda. Foi como ter 25 anos outra vez. É uma libertação sónica. (…) Sempre fiz saber aos rapazes que Type O está em primeiro. Portanto, sempre que temos tempo, tocamos e voltamos para casa com 20 dólares no bolso. Ok, minto. 25 dólares.»

Mas houve uma altura no ano anterior em que a desilusão de Steele com a sua situação pessoal o levou a questionar o próprio propósito de prosseguir com qualquer coisa. Para si, a morte da mãe foi o último pontapé na boca após um longo período passado em relacionamentos condenados e a enfrentar o que descreve como os dois grandes males da vida: ter muito tempo e ter muito dinheiro.

«A morte da minha mãe foi provavelmente a pior coisa que já me aconteceu. Isso também entrou em jogo ao fazer o “Dead Again”. Não me vou elogiar e dizer que sou criativo. Mas acho que durante um ano o meu lema foi: ‘Para quê?’ Por que é que hei-de fazer isto, por que é que hei-de tocar, por que é que hei-de comer, por que é que hei-de ensaiar – para quê?»

Mas foi com os Carnivore a proporcionarem uma ventilação criativa que Steele foi finalmente capaz de canalizar as suas sensibilidades mais refinadas de volta a Type O Negative – uma espécie de interacção entre Dr. Jekyll e Mr. Hyde que lhe deu o equilíbrio de que precisava. É um processo artístico que compara a «cagar num leitor de CDs», mas para Steele é evidente que é mais do que isso. É do coração.

«Tenho problemas com amor e tenho problemas com perdas», diz. «Têm sido um tema recorrente na minha vida, seja em 1990 ou em 2007. Se amo alguém e de repente encontram outra pessoa e vão embora sem qualquer explicação, sinto-me um idiota. Por que é que estive com essas pessoas durante 10 malditos anos, um dia acordam e dizem que os seus sentimentos mudaram?», diz, parecendo engasgado. Esta não é uma anedota aleatória. Peter limpa a garganta e continua. «Se pudesse, lidaria com as coisas de maneira diferente, mas há muito poucos motivos para… viver? Ou por ir para a cadeia. Recentemente, percebi que é muito melhor morrer por algo do que viver por algo. Estou apenas a procurar uma razão para morrer.»

É aquela visão sombria do amor que inspirou grande parte do conteúdo lírico de “Dead Again”, sem esquecermos a foto de Rasputin na capa, um dos heróis de Steele ao lado de Madonna («ela fodeu até ao topo, mas agora ri-se sozinha a caminho do banco de esperma») e do excêntrico inventor Nicola Tesla («um tipo muito badalado»).

«Rasputin… não o podiam matar», diz com admiração. «O gajo era um monge. Era um alcoólatra. Era um mulherengo. Era um lutador. E tinha um pau grande como o caralho. Eu ficava do tipo: ‘Pá, eu cinco das seis. Não tenho um pau grande, mas sou um cara-de-pau.’ Portanto, isto é “Dead Again”.»

Parece que se estava a referir a desgostos ainda há pouco.

«Oh sim», diz. «Isso é algo que acabou no ano 2000 e, como disse, não lido bem com perdas. Mesmo que já se tenham passado quase sete anos, ainda não superei. Não sei quem foi o idiota de merda que disse que era melhor amar e perder do que não ter amado sequer. Gostava de lhe dar um pontapé nos tomates. Sabes que mais? Não vale a pena, pá.»

E ainda toma antidepressivos?

«Na verdade sim, tomo Prozac», diz. «Tomo há mais de 10 anos. Sinto diferença quando paro de tomar. Sinto-me severamente deprimido durante toda a minha vida e nunca soube porquê. Posso dizer que não sou o gajo mais feio do mundo. Tenho tido algumas bandas decentes. Como é que posso estar tão deprimido? Quase que me sinto um ingrato do caralho.»

A teoria de Steele é que herdou isso da mãe («não estou a culpar os meus pais», acrescenta rapidamente). Soube entretanto que pouco antes da sua mãe o ter, a avó materna faleceu nos seus braços, deixando-a despedaçada e levando-a um pesado regime com aquilo que fora eufemisticamente chamado de tranquilizantes durante a gravidez. Possivelmente, isso poderá ter o mesmo efeito na produção de substâncias químicas de felicidade em Steele – da mesma forma que os esteróides afectam os culturistas. Peter não questionou o seu psiquiatra porque, infelizmente, «quem daria ouvidos a um maníaco de merda?»

Mas parece que a muleta mais forte de Steele continua a ser a sua música e, pelo menos agora, isso é que o mantém em movimento quando tudo na sua vida permanece no seu perpétuo estado de desordem deprimente.

«Uma última coisa», diz. «Quando as pessoas ouvem que eu posso ter-me matado ou algo assim, Kurt Cobain também é um dos meus heróis. Acho que é preciso muita coragem para saltar dum penhasco sem paraquedas. Não que ele o tenha feito, mas metaforicamente. Existem alguns motivos pelos quais eu não me mataria. Primeiro porque estou à espera duma punchline na vida. É como se tudo fosse uma piada negra. Isto não é uma declaração racista, aliás. E em segundo, vivo para irritar as pessoas que me detestam.»

Esperamos que as pessoas continuem a detestar Pete Steele durante muito tempo.

Consultar artigo original em inglês.

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