“Genesis XIX” merece um lugar de destaque na discografia do grupo. Vale uma hora de thrash metal sem palha-d’aço, bem metralhado...

Editora: SPV/Steamhammer
Data de lançamento: 27.11.2020
Género: thrash metal
Nota: 4.5/5

“Genesis XIX” merece um lugar de destaque na discografia do grupo. Vale uma hora de thrash metal sem palha-d’aço, bem metralhado e fiel ao percurso da banda.

O thrash metal continua aí. Nunca se foi embora. É como o fado, uma força da natureza. É uma música do povo, feita pelo povo, para o povo. Consoante a época ou o apetite das massas, com maior ou menor visibilidade, com maior ou menor exposição. O thrash não é a banda-sonora preferida dos santos populares, nem a dos nossos avós. Também não será a música ideal para estender a roupa ou para passar a ferro, mas continua a ser a música ideal nos baptizados do primeiro coma alcoólico e para atazanar o juízo aos vizinhos nos fins-de-semana prolongados. Já é assim há uns bons anos, pelo menos desde a altura em que Tom Angelripper – o Lemmy da Alemanha, o rocker mais cool do Vale do Ruhr – distribuía, em meados dos anos 1980, as primeiras demos de Sodom acompanhadas do slogan “heavier than Venom, faster than Metallica”. O slogan pegou, foram os primeiros do Big Four alemão, entre Kreator, Destruction e Tankard, a conseguir um contrato discográfico com a mítica Steamhammer/SPV. Eis como um herói da classe trabalhadora, nascido numa família de mineiros, cumpriu o velho sonho rock n’ roll e conseguiu escapar com o canastro intacto ao trabalho nas minas de Essen. Com 40 anos disto, os Sodom são uma instituição e continuam a ir a jogo. Mais vinte em cima do pêlo e os Big Four(s) todos ainda vão fazer uma orquestra num lar da terceira idade para seniores com necessidades especiais. Gracinhas à parte, esta é a realidade: Tom Angelripper não é excepção, já vai do meio para a frente, não é novidade.

“Genesis XIX” é um álbum em que os Sodom puxam dos galões de veteranos e aviam uma dúzia de novos temas segundo a máxima “keep it simple, play it fast”. A banda fez-se valer da experiência e sabedoria para apresentar um disco rigoroso, diversificado e equilibrado, em que todas as peças encaixam. A gravação trouxe um novo recruta, Toni Merkel, uma peça-chave do novo line-up, que, para além do destacado Tom Angelripper (baixo/voz), conta com Yorck Segatz e Frank Blackfire – outro da velha-guarda dos Sodom – nas guitarras. O baterista entrou na banda como um peixe na água e ainda contribuiu com o know-how e a experiência prévia com tecnologias de estúdio. Neste caso, o grupo seguiu um exemplo de gravação analógica, e resultou bem.

Depois de uma curta introdução instrumental, a banda entrega-se ao d-beat e aos riffs apunkalhados de “Sodom and Gomorrah”, que avança numa cavalgada desenfreada e entra pelos ritmos ainda mais acelerados de “Euthanasia” à mercê dos rugidos malévolos de Angelripper até ao solo alucinado de Frank Blackfire. Segue-se a faixa-título, um dos temas mais dinâmicos, marcado por várias ambiências e vincadas mudanças de tempo, que se aproxima da sonoridade blackened thrash dos primeiros tempos. Na sequência do tema “Nicht Meher Mein Land”, um devaneio em modo death metal, os Sodom inventam o “Glock ‘n’ Roll” a meio do álbum, com mais blast-beats e outro groove. Até aqui justifica-se a diversidade anunciada. “The Harpooneer” também o faz, a avaliar pela atmosfera doom no início, pela toada meio épica do tema inspirado no clássico de aventuras “Moby Dick” de Herman Melville. Para os amantes de punk hardcore, amigos da velocidade, e duma trashalhada old-school, osdois últimos temas “Indocrination” e “Friendly Fire” são duas bombas.

“Genesis XIX” merece um lugar de destaque na discografia do grupo. Não é um exercício qualquer de nostalgia, nem um exagero de speedaria juvenil retardada. O disco vale uma hora de thrash metal sem palha-d’aço, bem metralhado e fiel ao percurso da banda.