Perdidos no Arquivo: Transatlantic
Artigos 30 de Dezembro, 2020 João Braga
Uma travessia inesperada (1999-2002)
Os Transatlantic são um supergrupo multifacetado e multinacional. Esta panóplia linguística não é a única vertente de cariz diferenciadora desta banda que parece quase ser o animal de estimação dos seus membros, que têm aqui um cantinho criativo onde mostrar as suas excentricidades. Inicialmente surgiu como um quarteto fantástico a contar com a participação de Mike Portnoy, Neal Morse, Roine Stolt e Jim Matheos, com este último a ficar impossibilitado de participar no projecto. Assim, Pete Trewavas, dos Marillion, veio substituí-lo para acrescentar um quê de rock progressivo poético a um supergrupo com claras intenções de honrar os clássicos do género, como Yes, Genesis ou Camel, mas também para trazer ao de cima uma chama mais contemporânea a um rock progressivo maioritariamente complexo, poético e intrincado. Na verdade, a junção destes quatro ícones só poderia fazer adivinhar isso mesmo, com mestres do rock e metal progressivo a liderarem um projecto realmente ambicioso.
O que começou como uma brincadeira de quatro artistas tornou-se num supergrupo a completar 20 anos de carreira, e pelo que parece não querem findar as suas actividades assim tão cedo. Tudo começou com “SMPT:e”, de 2000, mas aquilo que veio a ser um álbum de culto rapidamente se tornou num costume quando, em 2001, sai também para as lojas o fortíssimo “Bridge Across Forever”. Nestes dois lançamentos, o quarteto mostra que, ainda hoje, é possível tonificar os ouvidos para um rock progressivo técnico, bem versado e muito próximo dos primitivos Pink Floyd e das banda acima mencionadas, trazendo uma certa rebeldia sonora com uma mistura de rigor académico e pungência criativa. Como tal, o álbum de estreia impactou na crítica profissional, que o descreveu «como um dos melhores álbuns de rock progressivo dos últimos tempos», e também acabou por surpreender com o número reduzido de faixas e a duração das mesmas, contendo a épica “All of the Above” com 31 minutos de duração. O quarteto também tira o chapéu à lendária e pioneira banda de rock sinfónico Procol Harum com uma cover do épico dos épicos “In Held (‘Twas) in I”.
O sucesso foi tal que, em 2001, “Live in America” apresenta o quarteto ao vivo no seu recreio criativo, onde claramente se diverte a tocar. “Bridge Across Forever” apresenta o mesmo número de temas do seu antecessor, mas sem qualquer cover no lançamento original, talvez porque a expectativa já era bem alta e não havia necessidade de criar uma comercialização que nomes como Morse, Portnoy, Trewavas e Stolt claramente não precisam. É um álbum conceptual que partilha um só movimento musical e uma sonoridade muito similar naquele que poderá ser um disco mais complexo do que o primeiro. A crítica voltou a adorar, solidificando a posição dos Transatlantic como um grupo de enorme culto para os fãs do bom e velho rock progressivo. Um fã dos clássicos ficou a perceber que é nos Transatlantic que terá uma solução moderna para satisfazer um gosto raramente encontrado nos dias de hoje.
Hiato e regresso em turbilhão (2009-2014)
Após um longo hiato, com os músicos a dedicarem-se às suas carreiras a solo ou às suas respectivas bandas, a banda preparou-se para aquele que viria a ser o projecto mais ambicioso da sua carreira. Em 2009, no ano do regresso, “The Whirlwind” é lançado, contendo apenas uma faixa com uns imponentes 77 minutos. Há muito que não se via uma composição tão longa, sendo das poucas bandas a tentar tal proeza, com excepção de colectivos clássicos dos anos 70.
A faixa apresenta 12 partes repletas de um rock progressivo mais aprimorado com algumas nuances técnicas mais apuradas, apresentando novas facetas que o diferenciam de álbuns anteriores. Apesar de diversos componentes modernos, como a instrumentalização sintética e os efeitos sonoros mais produzidos, há muita inspiração em Genesis e Yes, tal como um bom disco de rock progressivo conceptual deve ter. O impacto crítico foi garantido, tendo tido mais sucesso nas listas comerciais de vendas.
Após esta produção ambiciosa, o grupo desdobrou-se em concertos e em lançamentos de DVD. Falamos de quatro ícones da música que são altamente reconhecidos pelos seus desempenhos de excelência em concertos. De rajada, saem dois lançamentos ao vivo na Europa, como preparação para o disco de 2014, “Kaleidoscope”, que viu os Transatlantic a regressarem ao seu recreio progressivo habitual. Neste último lançamento de estúdio, o quarto, a banda regressa a um maior número de temas, contendo dois épicos de 25 e 31 minutos, “Into the Blue” e “Kaleidoscope” respectivamente. De novo, e apesar de não haver clarividência nisso, “Kaleidoscope” apresenta-se como um álbum conceptual com diversas variações temporais, compassos interligados e muita produção sonora que lhe atribui um estilo mais neo a um rock progressivo muitas vezes a roçar um ligeiro, muito ligeiro, metal progressivo. O quarto disco de originais ganhou o prémio de Álbum do Ano no Progressive Awards. Como tal, “KaLIVEoscope” é lançado no mesmo ano, fornecendo alguns dos melhores desempenhos daquele período.
The Absolute Universe (2020-)
Apesar de oficioso, a banda volta a parar após o sucesso do quarto longa-duração. O quarteto nunca o oficializou, mas essa é a realidade – aliás, é a realidade de muitos supergrupos que nunca são vistos como prioritários pelos seus próprios membros. Mas, passados sete anos após “Kaleidoscope”, está previsto o lançamento de “The Absolute Universe”, que promete arrasar as expectativas dos fãs com algum do material conceptual mais promissor dos últimos anos.
Em 2020 já se pôde desfrutar de um aperitivo com “Overture / Reaching for the Sky” e “The World We Used To Know”, dois temas poderosos e cheios de inteligência conceptual, com auxiliares visuais muito bem concebidos. Do que já é conhecido, epicidade poderá ser o termo correcto para descrever um dos álbuns mais esperados de 2021.

Metal Hammer Portugal

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