Napalm Death “Throes of Joy in the Jaws of Defeatism”
Reviews 16 de Setembro, 2020 Diogo Ferreira


Editora: Century Media Records
Data de lançamento: 18.09.2020
Género: grindcore / hardcore punk / death metal
Nota: 4.5/5
O mais incrível e animador é que o tempo não parece passar pelos Napalm Death: 40 anos depois continuam a inovar e a surpreender musicalmente, bem como a meter o dedo na ferida sem medo.
Nunca os Napalm Death nos fizeram esperar tanto por um álbum e foi com grande antecipação que os fãs aguardaram por uma novidade discográfica dos padrinhos do grindcore combinado com hardcore punk. Portanto, ei-lo: “Throes of Joy in the Jaws of Defeatism”.
O grupo de Birmingham nunca foi apenas uma banda no estrito sentido de se criar música e está feito, havendo sempre toda uma atitude interventiva inclinada ao humanismo, em que se inclui antifascismo, anti-guerra e liberdade sexual. Ao fim de 40 anos não é diferente.
Com um título construído através de um oxímoro (combinação engenhosa de palavras cujo sentido literal é contraditório ou incongruente), o vocalista Mark ‘Barney’ Greenway disse à Metal Hammer Portugal: «Se és apanhado pelas mandíbulas – uma armadilha, basicamente –, é claro que vais batalhar para sair dali, vais entrar em pânico e batalhar. Mas queria ir no oposto disso, queria sugerir que ia fugir das mandíbulas de algo com positivismo. Estou literalmente a livrar-me destas mandíbulas restritivas.» Mas o que está realmente por detrás disto é mais profundo do que apenas figuras de estilo e truques linguísticos. “Throes of Joy in the Jaws of Defeatism” é sobre o ‘outro’ – e quem é o ‘outro’? É o refugiado, o deslocado, o desajustado LGBTQ+. Ainda na mesma conversa com a Metal Hammer Portugal, Barney alertou: «O aumento do nacionalismo e populismo levou-nos a muita discriminação. A forma sobre como falam dos refugiados… Falam de pessoas que fogem de situações muito perigosas de forma muito desumana, um desumanismo muito, muito, muito perceptível. E também sobre outras coisas. Falam de pessoas LGBTQ+, até por alguns governos, como não estando ao mesmo nível de outros seres humanos. Lugares como a Polónia têm zonas livres de gays – pensa nisso! Como é que isso é humano de todo?»
Em oposição a letras humanistas e pacifistas surge então a música abrasiva, agressiva e de confronto dos Napalm Death. E o mais espantoso é que ao fim de tantos anos de existência, estes veteranos continuam a conseguir inovar e a superarem-se a si mesmos em criatividade. Como ponta-de-lança, já sabemos que um álbum de Napalm Death vai soar a punk, hardcore, death metal e grindcore, portanto não nos adianta muito repisar o conhecido, e o que temos de fazer é destacar a revolução que a banda organizou dentro de si. E há muito para destacar.
Logo a abrir, “Fuck the Factoid” arrasa-nos com um sentido de fatalidade iminente, tal é o peso e a inquietação com que inauguram os próximos 42 minutos de ataque bravio. Mais: não perdem tempo e saem logo da zona de conforto com uma ambiência black metal – sim, leste bem!
Mais à frente, com a terceira “That Curse of Being in Thrall” somos arrebatados por blast-beats death metal, cortesia de Danny Herrera, num tema que evolui para um hardcore metálico de cortar a respiração, tamanha a insanidade de violência sonora, quase psicótica mesmo na sua fase final.
Depois disto – algures entre Napalm Death vintage e Napalm Death 2020 –, as primeiras grandes estranhezas são-nos oferecidas de mão beijada com “Joie de ne pas vivre” através de um industrial perturbador, uma mistura bastarda entre bateria hardcore, berros efervescentes black metal e experimentalismo vanguardista de uns Einstürzende Neubauten (uma abordagem que se repete na última “A Bellyful of Salt and Spleen”).
Não nos ficamos por aqui e a nona “Amoral”, que já é conhecida do grande público, mostra-nos uns Napalm Death a irem beber ao passado – não propriamente do seu próprio passado, mas de um mais global em relação ao Reino Unido. “Amoral” é, pura e simplesmente, um tema inspirado em post-punk com uma onda muito Killing Joke que ao ler-se apenas pode destoar mas que ao ouvir-se assenta espectacularmente no alinhamento do álbum. Sobre isto, Barney esclareceu à Metal Hammer Portugal: «Para nós, é natural. Não é uma coisa que se atire ao ar. Sabemos que temos uma ampla paleta de influências, sentimos que sabemos mais sobre amalgamar essas influências, portanto não tens uma música que é a mais rápida, depois uma ao estilo de Swans e outra na sonoridade de Killing Joke – agora misturamos isso tudo para que possamos ter uma música que tenha os aspectos distintos dessas três.»
Como último destaque, depois de inicialmente ouvirmos Barney a berrar efusiva e furiosamente num espaço que podia muito bem ser uma casa-de-banho ou um corredor amplo e oco, a música do tema-título – que é poderosa, de murro na cara e punho no ar – faz jus ao conceito libertador do álbum. Nota mais ainda para o baixo metalizado de Shane Embury que oferece muito corpo aos temas em todo o registo mas em particular nesta composição.
É cliché, mas os panteões estão destinados aos melhores. A banda ainda não cessou funções – e parece estar longe disso –, mas o seu lugar na História já é garantido. O mais incrível e animador é que o tempo não parece passar pelos Napalm Death: 40 anos depois continuam a inovar e a surpreender musicalmente, bem como a meter o dedo na ferida sem medo numa fase das nossas vidas em que o ditador, o assassino e o racista são endeusados diariamente nas redes sociais. Napalm Death é mais do que música (mesmo que não o queiras), por isso nada melhor do rematar este texto com as palavras do próprio Mark ‘Barney’ Greenway: «Temos que nos erguer, porque, sejamos honestos, o número das vozes anti-outro é mais barulhento do que o das pessoas que defendem e falam pelo outro. Comunicação e diálogo têm de começar a acontecer. Nós, que entendemos humanidade, não temos voz suficiente – não temos! Há pessoas que defendem os outros, mas parece que nunca é ao mesmo nível [de quem não defende]. Sugiro que se continue!»

Metal Hammer Portugal
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