Como os pranksters do art-metal Mr. Bungle conseguiram o regresso mais inesperado do ano com uma pequena ajuda de Scott Ian...

Como os pranksters do art-metal Mr. Bungle conseguiram o regresso mais inesperado do ano com uma pequena ajuda de Scott Ian e Dave Lombardo.

Foto: Buzz Osborne

Mike Patton parece desarmantemente animado. «Heeeellloooooo!», diz arrastadamente no seu barítono característico antes de se apresentar e perguntar calorosamente que tipo de dia estamos a ter. Não é o que esperávamos de um homem que tem uma certa reputação de entrevistado difícil. Achávamos que íamos apanhar com o subversivo mais notório do metal, mas em vez disso passámos quase uma hora na companhia de um cavalheiro encantador, caloroso e sorridente.

Mas talvez devêssemos esperar ser surpreendidos por Mike Patton. Afinal passou 35 anos de carreira a fazer o oposto do que os fãs esperam, ou mesmo desejam em muitos casos, com uma alegre regularidade. A prova de que ainda tem prazer em fazer escolhas de carreira incomuns e imprevisíveis foi a decisão de ressuscitar a sua primeira banda no ano passado, os terroristas barulhentos e sem rótulos Mr. Bungle, exclusivamente para actuar e regravar a maquete de estreia de 1986, “The Raging Wrath of the Easter Bunny” – uma maquete que a maioria das pessoas nunca ouviu ou soube que existia. Como se isso não fosse estranho o suficiente, adicionaram a realeza do thrash metal às suas fileiras na forma de Dave Lombardo, ex-baterista dos Slayer, e Scott Ian, o senhor do riff dos Anthrax. Quem estava à espera disso?

«Queríamos que fosse a reunião mais f*dida de sempre, e acho que foi assim que aconteceu», ri Mike quando perguntamos de onde raio veio essa ideia. «Porque não andamos a tocar os êxitos, não andamos a tocar nada que as pessoas conheçam. Primeiro foi uma piada, e de repente… estava a acontecer!»

Dá para ver que Mike está feliz por se ter reunido com velhos amigos, mais uma vez a confundir toda a cena musical. Com felicidade, presenteia-nos histórias dos primeiros tempos da banda enquanto crescia com o baixista Trevor Dunn e o guitarrista Trey Spruance na pequena localidade de Eureka, Califórnia, onde consumiam música e ansiavam por escapar dos seus confinamentos.

«Éramos apenas malucos!», grita. «Acho que é difícil explicar às pessoas, que não cresceram naquele ambiente, o quão desesperado ficavas para fugir. A música era tudo para nós. Trabalhei na loja de discos local e encomendava discos estranhos e maravilhosos. A loja tinha de pagar a conta. Abria um [disco] e fazia uma cópia em cassete para mim, depois voltava a selar para pôr à venda. Do tipo: ‘Oh, os Minor Threat soam bem… Vamos encomendar!’ Não importava se era Slayer ou Stravinsky, rodávamos tudo!»

Estes jovens maleáveis formaram Mr. Bungle em 1985 e lançaram um punhado de maquetes que saltavam e pulavam do thrash à salsa e ao ska, sem se levar em conta as convenções de género, antes de Mike ser caçado por Faith No More e tornar-se uma super-estrela. Apesar disso, continuou à frente de Bungle. Quase certamente devido ao seu sucesso nos FNM, a banda assinou com a Warner Bros em 1990 e lançou, nessa década, três álbuns brilhantemente bizarros e distintamente únicos que confundiram alguns e irritaram outros, mas, crucialmente, inspiraram uma geração inteira de futuros músicos.

«Acho que há um mistério à volta duma coisa que já não existe e as pessoas são seduzidas por isso…»

Mike Patton

Nos anos seguintes, a lenda de Mr. Bungle cresceu, com bandas como Korn, System Of A Down, The Dillinger Escape Plan e Mastodon a citá-los como influência crucial. Tamanha é a admiração dos Avenged Sevenfold que fizeram uma cover da música “Retrovertigo” para a edição de luxo do álbum de 2016, “The Stage”. Perguntamos a Mike por que é que acha que a sua banda alcançou tamanho estatuto de culto. «Como raio sei eu?!», ri e cospe-se. «Acho que há um mistério à volta duma coisa que já não existe e as pessoas são seduzidas por isso… E não andamos por aí há muito tempo!»

Foi no final do ano 2000, apenas um ano após o lançamento do melhor álbum da carreira, “California”, que os Mr. Bungle desapareceram. Não houve uma declaração, nenhum concerto final, nenhuma imprensa – simplesmente sumiram. Com o passar dos anos, parecia menos provável que voltassem.

«Oh, eu lembro-me por que nos separámos», explica Mike. «Não nos estávamos a dar bem. Foi isso. Mas envelheces, encontras as pessoas e voltas a ligar-te, e lentamente todos aqueles velhos problemas parecem não importar tanto.»

O mundo pode não ter visto a reunião a acontecer, mas Mike diz que, ao voltar a ligar-se a Trevor e a Trey na última década, os três passaram grande parte do tempo a brincar com a ideia de se ressuscitar Mr. Bungle. «Há anos que falávamos sobre isso», conta. «Durante muito tempo, era apenas uma piada tonta que dizíamos uns aos outros, do tipo: ‘Não seria estranho se voltássemos? Ninguém esperava por isso!’ Depois, certo dia, o Trevor teve esta ideia maluca: ‘Por que é que não chamamos o Lombardo para tocar as nossas músicas antigas?’ E eu pensei: ‘É uma ideia muito boa.’ Porque se nos íamos reunir, então não seria da maneira normal.»

No início, os Bungle costumavam fazer air-drumming ao som de Slayer na carrinha, e Mike e Trevor trabalharam com Dave no supergrupo hardcore punk Dead Cross, portanto sabiam que o baterista acertaria em cheio no material. Depois, Mike percebeu que precisavam de um guitarrista ritmo, e Scott Ian veio à cabeça. Não se conheciam bem, mas Mike sabia que Scott era fã, já que tinha estado nos seus concertos. «Contactei-o e… acho que se assustou!», exclama Mike. «Acho que ele pensou que eu ia enviar-lhe novas cenas de Bungle, e tive de explicar: ‘Não, quero que faças parte da merda da banda!’ E foi assim que aconteceu.»

«Oh, eu lembro-me por que nos separámos. Não nos estávamos a dar bem.»

Mike Patton sobre a separação de Mr. Bungle em 2000

Finalmente, depois de anos à procura do mais estranho dos motivos para se reunirem, os Mr. Bungle tinham o que precisavam – voltar à incarnação metal mais antiga, mais thrash e mais visível da banda. «Ouvimos as músicas antigas novamente, e pensámos: ‘C*ralho! Parece que foi gravado com um aspirador!’», grita Mike. «Mas demos o nosso melhor na altura. Tínhamos todos 16 anos. Percebemos que, na verdade, a música era muito boa. Então foi do tipo: ‘Vamos fazer isto sem mexer muito, e fazer um documento real de como soávamos na época.’ Muitas pessoas pensam que Mr. Bungle é um tipo diferente de banda, não entendem essa nossa parte [thrash metal], mas está-nos no sangue. E não [vamos] apenas documentar, vamos fazê-lo com dois gajos que nos inspiraram a fazer aquela música – com o Scott Ian e o c*ralho do Lombardo! Quero dizer, se alguém te põe isso no prato, ficas do tipo: ‘Sim, estou a comer!’»

O álbum é lindamente evocativo dos dias de glória do thrash metal, com aquele tom inconfundível da guitarra de Scott Ian e o desprotegido ritmo selvagem de Dave Lombardo a complementar perfeitamente a natureza mais idiossincrática dos membros originais de Bungle. «É thrash metal dos anos 80? Sim, é », diz Mike. «É uma marca do tempo, é música temporal. Mas é daí que vimos.»

Pode ser daí que os Mr. Bungle vieram, mas para onde vão a partir daqui? Há uma pausa. «Não faço ideia», desabafa Mike, antes de mandar mais uma gargalhada saudável. «Quem sabe. Estamos a modos que a fazer acontecer à medida que avançamos!»

Bem, estavam à espera que ele dissesse o quê?

Consultar artigo original em inglês.