“Mallevs Maleficarvm” é um álbum forte, rico em melodias que tocam cá dentro, avantajado em narrativa e com uma substância colectiva...

Editora: Ethereal Sound Works
Data de lançamento: 12.09.2020
Género: doom/gothic metal
Nota: 4/5

“Mallevs Maleficarvm” é um álbum forte, rico em melodias que tocam cá dentro, avantajado em narrativa e com uma substância colectiva (música meets conceito) muito sui-generis que não é assim tão fácil de encontrar no nosso país.

Fundados em meados dos anos 1990, numa época em que thrash, death e doom metal estavam a florescer no underground português, os Dogma deram os primeiros passos com uma demo e dois EPs até que se separaram nos primeiros anos do novo milénio. Em 2014 regressaram para lançarem o primeiro longa-duração “Reditum” em 2017.

Rejuvenescidos – a idade também traz destas coisas –, chegam a 2020 com “Mallevs Maleficarvm”. E se “Reditum” já era bom – com temas como “Rosa” –, garantimos que esta novidade é ainda melhor, mais madura e com uma narrativa coesa, tanto ao nível conceptual como musical.

O título, que é basicamente um manual de combate às bruxas datado do Séc. XV, remete-nos imediatamente para esse cenário ocultista e medieval, e caso o álbum avance e não tenhas captado a essência lírica à partida, então a faixa “A Hora do Último Sol” desfaz todas as dúvidas: estacas, fogo, roupas queimadas, aplausos, histeria.

Baseados numa sonoridade que cruza doom e gothic metal, os longos temas (entre os 5 e 10 minutos) são alimentados por ritmos lentos e médios que nos induzem a um estado melódico e melancólico à custa de guitarras tensas que tanto comprimem em riffs apertados como se soltam em solos luzidios. Mas o coração deste álbum baterá mais forte quando a dupla vocal Gonçalo Nascimento e Isabel Cristina nos explana carinhos perdidos e horrores sentimentais. Enquanto Gonçalo Nascimento se foca nos growls e num spoken-word poético (“Mallevs Maleficarvm” é pura poesia) com um sentimento de alma intoxicada e enclausurada, Isabel Cristina representa a ala folclórica e popular com uma voz cristalina que une abordagens operáticas e angelicais com um toque de perdição aqui e reencontro acolá.

No seu todo, “Mallevs Maleficarvm” acaba por nos oferecer um rumo progressivo (o que é óptimo quando se quer contar uma história corrida), mas a grande conquista deste disco passa pela forma como evocam um ambiente popular ao transformarem os cancioneiros das aldeias e canções de embalar em músicas metal de oito minutos – “Asmodeus” e “Deus Assassino”, com refrãos muitíssimo cativantes, são os melhores exemplos disso. Por seu turno, “Porque Não Te Escondes de Mim” é uma mescla entre o rock alternativo de uns Rádio Macau, o doom de uns Tiamat e o goth de uns The 69 Eyes, e “Velho do Mar” proporciona-nos um momento plenamente folclórico.

“Mallevs Maleficarvm” é um álbum forte, rico em melodias que tocam cá dentro, avantajado em narrativa e com uma substância colectiva (música meets conceito) muito sui-generis que não é assim tão fácil de encontrar no nosso país. Aconselhável!

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