Entrevista a My Dying Bride sobre o EP "Macabre Cabaret".
Foto: John Steel

«São histórias que te levam numa viagem para longe das vidas horríveis que vivemos no planeta Terra neste momento.»

Aaron Stainthorpe sobre o EP “Macabre Cabaret”

Menos de um ano depois de terem lançado o LP “The Ghost of Orion”, os My Dying Bride fecham 2020 com o EP “Macabre Cabaret”, um registo de três faixas com data de lançamento a 20 de Novembro através da Nuclear Blast.

Para percebemos como tudo decorreu para aqui chegarmos, a Metal Hammer Portugal conversou com o vocalista Aaron Stainthorpe. «Estas músicas foram gravadas ao mesmo tempo que as de “The Ghost of Orion”», esclarece. «Quando gravámos não sabíamos que músicas iam para o EP e que músicas iam para o álbum, mas sempre soubemos que gravámos demasiado para o álbum e o que ficasse para trás ia para o EP. O problema é que não conseguíamos concordar sobre que músicas iam para o EP e que músicas iam para o álbum, portanto perguntámos à Nuclear Blast se podiam tomar essa decisão. Os My Dying Bride só discutiam [sobre isso] porque são todas boas músicas. É difícil escolher o que vai e o que fica. Simplesmente deixámos que a Nuclear Blast o fizesse, e eles escolheram as músicas que acharam melhores para o álbum e as melhores para o EP. É uma escolha corajosa, porque muitas pessoas pensam: ‘Ok, se estas músicas não foram para o álbum, então devem ser mais pobres.’ Mas acho que não é o caso, porque quando a Nuclear Blast pensou em lançar o EP, queriam material forte para esse EP – caso contrário, não vende e toda a gente o vai detestar. Penso que escolheram muito sabiamente e ficámos com boas faixas para o EP.»

Com um conceito direccionado ao sexo e aos afectos, “Macabre Cabaret” e suas suas músicas são mais negras e sombrias do que as presentes no LP. «Gostamos de material realmente negro», responde quando questionado sobre se fizeram música para os fãs de My Dying Bride com coração mais enegrecido. «Quando se fala de música negra, isso não tem necessariamente de aterrorizar as pessoas. Julgo que tens de olhar para a alma das pessoas, encontrar coisas que façam o teu coração bater um pouco mais rápido. Muitas músicas heavy metal são sobre violência e esse tipo de maluqueiras, mas não para mim – gosto que seja mais sensível, e sempre escrevi nesse sentido, num estilo poético. Gosto de poesia e de introduzir poesia nas minhas letras, e espero que algumas pessoas que leiam as minhas letras possam ir ler poesia a seguir, o que seria excelente. Por vezes, a poesia permite-te falar sobre assuntos sensíveis de uma forma mais fácil, penso eu. Acho que também é por isso que temos um vasto público feminino. As raparigas gostam mesmo de My Dying Bride, e acho que isso é bom porque o mundo heavy metal é de homens, e se conseguirmos fazer algumas coisas que tragam mulheres para isto, então acho que é bom. Falar sobre assuntos mais sensíveis, como a paixão negra que tanto gosto de escrever, funciona muito bem, as raparigas gostam muito e acho que é, de facto, uma coisa boa.»

À semelhança do LP, o novo EP continua numa rota de simplicidade, algo que os My Dying Bride têm querido alcançar no presente momento, com música mais relaxada, mais acessível e menos complexa, mas sempre profunda e melancólica. Trinta anos depois, de que forma estará Aaron a desfrutar da hipótese de fazer o que quer? «É óptimo!», atira. «Trabalhámos arduamente ao longo dos anos para tentarmos ser técnicos, para exagerarmos um pouco, para provarmos que somos habilidosos quando compomos músicas. Não vamos fazer uma música de três minutos com um verso e um refrão, um verso e um refrão, um solo de guitarra e depois outro refrão… Podemos fazer isso, mas não queremos! Queremos contar histórias, e, por vezes, quando contas histórias não é sempre ao mesmo ritmo – mudas o ritmo, mas a história progride e evolui. É assim com “Macabre Cabaret”, são histórias que te levam numa viagem para longe das vidas horríveis que vivemos no planeta Terra neste momento. Levam-te por uma viagem fantástica para longe disto. Vai continuar a ser uma viagem negra, mas tem paixão e muito sentimento. É bom poder escrever de modo mais relaxado – manter alguns dos riffs simples, alguns dos cativantes, mantê-los e não mandá-los fora por algo mais técnico, já o fizemos no passado. Sacamos umas linhas do caraças, não fazemos muitos solos, mas quando o Andrew [Craighan] faz um é excelente. As harmonias de guitarra são maravilhosas, há violino e violoncelo… Às vezes, isso faz com que a pele e os cabelos se ericem quando ouves certos momentos – é um prazer escrever esse tipo de momentos. Não sei se a próxima coisa que lançarmos vai ser de audição fácil ou se vamos voltar a fazer material mais técnico, ainda não planeámos isso, mas estamos a desfrutar do clima de composição em que estamos agora.»

«Não sei se a próxima coisa que lançarmos vai ser de audição fácil ou se vamos voltar a fazer material mais técnico, ainda não planeámos isso, mas estamos a desfrutar do clima de composição em que estamos agora.»

Aaron Stainthorpe

Tendo em conta esta inclinação mais acessível, em Março de 2020, Aaron confidenciou à Metal Hammer Portugal: «Sei que algumas pessoas dizem que agora, que My Dying Bride mudou para Nuclear Blast, vamos ficar mais suavizados, mas já o tínhamos decidido antes de irmos para a Nuclear Blast.» Será que a banda foi alvo de críticas menos amigáveis ou era só um receio prévio do vocalista? «Não ouvimos nada disso vindo dos jornalistas com quem falámos», assegura, «mas, obviamente, quando passas os olhos pelas redes sociais, vês uma ou duas pessoas cínicas… ‘Ok, assinaram pela Nuclear Blast, têm esta grande produção, não se parece nada com o material antigo, portanto venderam-se.’ Acho que nenhum novo álbum soa ao material antigo quando se anda por cá há 30 anos. É claro que progrides, que evoluis, não queremos tocar as mesmas coisas repetidamente, queremos maturar e, como um bom vinho, queremos ficar melhores à medida que envelhecemos – e acho que não há nada de errado nisso. Os jornalistas têm dado muito apoio, há apenas algumas vozes cínicas nas redes sociais, mas pouco para ser honesto – achava que ia haver mais, mas penso que estamos bem. Tens de ter em conta que um álbum mais comercial de My Dying Bride continua a ser um álbum muito difícil para a maioria – é negro, complexo, não é feliz, as letras são difíceis de compreender. Não é verdadeiramente comercial, não é Guns N’ Roses, mas do ponto de vista de My Dying Bride acho que é um pouco mais comercial».

Ainda sobre a entrevista concedida no primeiro trimestre do ano, ficámos a saber que Aaron Stainthorpe batalhou muito para estar em My Dying Bride e para gravar “The Ghost of Orion”, especialmente devido ao estado de saúde da filha, ainda criança, que lutava contra um cancro. Na altura, comentou: «Todo o trabalho em estúdio foi um pesadelo para mim, tão difícil voltar a isto, quase senti que ia sair quando voltámos a gravar. Foi um período muito duro, e estou a batalhar para voltar a estar totalmente ligado a My Dying Bride, mas está a surgir.» Cerca de oito meses depois, Aaron volta a abrir o peito e, satisfatoriamente para todos, o músico está numa fase de vida muito melhor, mesmo com a pandemia a assolar o mundo. «Foi muito matreiro, mas o tempo cura tudo», sublinha. «Acho que agora estou completamente de regresso a My Dying Bride. Não estava quando fiz o álbum e, por conseguinte, também não estava quando fiz este EP, mas agora vivo as músicas e a banda, e acho que as coisas estão a progredir na direcção certa para mim e para a minha família, portanto é muito bom. Cada dia é melhor, sentes-te mais ligado, sentes que queres fazer parte do grupo novamente. Mesmo que não tenhamos dado concertos – e não demos concertos durante dois anos antes da quarentena –, continuamos a ensaiar, por isso encontro-me com eles uma vez por mês e é bom. Formámos uma banda para tocar música, portanto é claro que vamos ensaiar, mesmo que não haja concertos. Talvez haja alguns no próximo ano, mas mesmo esses podem não acontecer, o que é uma pena, mas gostamos de fazer música, gostamos de a tocar e de a apresentar. De momento, o Andrew está a compor música nova – ainda não trouxe nada para os ensaios, mas está a compor. De momento, estamos bem, sim.»