O death metal não consegue ser mais muito mais perfeito do que o que ouvimos em “Violence Unimagined”.

Editora: Metal Blade
Data de lançamento: 16.04.2021
Género: death metal
Nota: 4.5/5

O death metal não consegue ser mais muito mais perfeito do que o que ouvimos em “Violence Unimagined”.

Milhões de discos vendidos em todo o mundo, 15 álbuns de longevidade, uma paixão platónica pelas plataformas de censura, de Portugal ao Japão e, muito provavelmente, o primeiro nome que vem à cabeça de muita gente quando o tema em questão é o death metal. Podemos traduzir tudo isto em duas palavras – Cannibal Corpse. Os nova-iorquinos tornados floridenses regressam após um muito bem-recebido “Red Before Black”, mas, desta feita, sem Pat O’Brien e com Erik Rutan, o que não só muda toda a dinâmica do grupo como deixou fãs e imprensa na expectativa de como soaria o novo registo. São pequenos detalhes como este que costumam fazer toda a diferença no próximo disco de uma banda.

Felizmente, “Violence Unimagined” consegue meter “Red Before Black” a um canto em todos os sentidos: estruturas rítmicas, solos incríveis, o aumento do nosso interesse a cada música que passa, a evolução constante de Paul Mazurkiewicz (bateria) e, claro, a capa. Lembram-se da importância das capas de Cannibal Corpse na promoção do seu som nos primeiros quatro discos e de como elas se foram diluindo ao longo da sua carreira? A capa não censurada de “Violence Unimagined” é um regresso a esses tempos, a uma altura em que o politicamente correcto ainda não existia e vivíamos num estado constante de free for all, um tempo em que quase tudo era permitido. Isto para dizer que quem achar que a capa de um disco não é um factor importante (até para divulgação do mesmo, note-se) está no ramo errado e em negação.

Passado o pontapé no dentes que a capa nos prega, constatamos que “Violence Unimagined” consegue realizar a proeza de manter os Cannibal Corpse no cume do Evereste do death metal ao fim de 33 anos de actividade ininterrupta, tudo graças ao seu som pungente e sem aditivos. Como já é habitual, os Cannibal Corpse iniciam o novo registo com um tema que não deixa margem para dúvida do que aí vem. “Murderous Rampage” oferece-nos uma vez mais os Cannibal Corpse de “Butchered at Birth” e até a voz de Fisher, que termina as frases com voz rasgada em vez de urros, nos faz lembrar um pouco Chris Barnes e toda a inovação vocal que traria uns anos mais tarde em “The Bleeding”.

Claro que, a juntar a isto tudo, temos São Rutan ao comando da guitarra, um factor que eleva o nome da banda um pouco mais alto em todo o registo, com um som mais cru, mais orgânico e sem artifícios de estúdio. Será escusado referir que o novo disco dos Cannibal Corpse é o que é muito graças a Erik, tanto na guitarra como na produção. “Necrogenic Resurrection” é mais Cannibal Ccorpse vintage e sólido, em que Rutan e Fisher voltam a brilhar. Mas não são os únicos a fazê-lo, e isso é aparente quando ouvimos “Inhumane Harvest”, o tema escolhido para teaser do novo trabalho dos americanos. Embora os solos de Rutan e Barrett pisquem o olho às batalhas de grandes solos de bandas maiores dos anos 90, é Mazurkiewicz quem brilha como em nenhuma outra música de “Violence Unimagined”, com uma passada muito forte nas partes lentas e com uma velocidade e agressividade da tarola praticamente nunca antes ouvida nos Cannibal Corpse.

“Surround, Kill, Devour” é mais um momento clássico de death metal como só os Cannibal Corpse conseguiriam criar, desta vez com uma toada cheia de groove a fazer lembrar mais Six Feet Under. E também Alex Webster (baixo) dá um arzinho da sua proeza musical em “Follow the Blood”, um registo no qual podemos ouvi-lo com uma clareza ausente desde “The Bleeding”. As suas partes neste tema mais parecem extraídas de um disco de death metal técnico/progressivo, o que demonstra que a banda não é um ou outro elemento, mas o conjunto, o total dos membros. “Ritual Annihilation” expõe novamente a besta que é Mazurkiewicz ao comando das baquetas: rápido, intenso, técnico, variado.

Também é um dos momentos altos do trabalho de Fisher – bastante intenso e agressivo. Depois voltam os solos magníficos – melódicos e tipicamente americanos, inspirados, pertença exclusiva dos grandes nomes. “Bound and Burned” faz-nos crer que a banda tentou de facto reviver as glórias passadas, mas não, é apenas mais uma música dos novos Cannibal Corpse. As guitarras teimam em deixar-nos agarrados e a repetir a dose mais uma vez, qual toxicodependente que, vezes sem conta, diz para si próprio que é só mais esta vez… Embora ainda não estejamos habituados aos novos Cannibal Corpse, só esperamos que se mantenham assim doravante.

“Slowly Sawn” e “Overtorture” resumem, em parte, a fórmula por detrás de “Violence Unimagined”, que se baseia em tema rápido seguido de tema arrastado seguido de tema rápido. Embora seja um cliché, só assim poderíamos contemplar o melhor que as partes rápidas e mais lentas de “Violence Unimagined” têm para nos oferecer. “Cerements of the Flayed” termina o disco com a tal lentidão repleta de groove, e é curioso verificar o contributo deixado pelos Slayer a todas as bandas mais extremas nos momentos mais lentos.

Assim, “Violence Unimagined” faria lembrar um disco de Deicide caso Glen Benton & Cia. falassem sobre mutilação, vivissecção, sangue, tripas e órgãos a voar por todos os lados. Ou seja, com “Violence Unimagined”, a banda consegue transmitir a intensidade profana dos Deicide, mas sem alguma vez deixar de soar a quem verdadeiramente é, e isso é Cannibal Corpse. E, voltando ao início, tudo isto merece o quê? Merece o que os primeiros discos dos Cannibal Corpse mereceram – uma nota a roçar a perfeição. Até porque o death metal não consegue ser mais muito mais perfeito do que o que ouvimos em “Violence Unimagined”.

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