Aversio Humanitatis: «Todo o álbum gira em torno da ideia de como criamos os nossos próprios grilhões»
Entrevistas 18 de Junho, 2020 Metal Hammer
Junho revela-nos “Behold the Silent Dwellers” e a Metal Hammer Portugal não perdeu a oportunidade de entrevistar Aversio Humanitatis para conhecermos um pouco melhor as mentes por trás de um trabalho tão especial.

Aversio Humanitatis começou por ser um projecto a solo de S., mentor, produtor e guitarrista, ao qual se juntou o baterista J., com quem integrava Eterna Penumbra, e depois A. como vocalista e baixista. Neste longa-duração, N.H.T., até aqui guitarrista de apoio, também acabou por dar o seu contributo na composição de “The Watcher In The Walls”. A propósito dessa participação, arriscámos reflectir sobre o que faz com que na história da banda e no metal, em geral, prevaleça a génese colaborativa. «É difícil responder a essa pergunta em nome dos outros membros.», diz-nos S.. «Penso que cada um de nós o faz por diferentes razões. O que mais gosto é o aspecto criativo, a composição, as diferentes peças e a direcção da banda, isto mantém-me motivado e focado. Para alguns de nós, as ideias por trás da banda são o mais importante, para outros, é mais sobre o aspecto musical. Quem sabe, nós realmente não falamos sobre esses aspectos filosóficos, apenas juntamos esforços e todos desempenham o seu papel. Mas suponho que o ponto em comum é todos sentirmos que, como banda, criamos algo humildemente maior do que cada um de nós individualmente. É entusiasmante fazer álbuns que nos dão aquela sensação de satisfação quando os terminamos, que nos permitem desabafar e canalizar muitas coisas, e também é bom ver outras pessoas conectarem-se com eles.»
O álbum surge-nos nesta estranha era em que conceitos como isolamento adquiriram novo sentido e em que o contacto filtrado por ecrãs pode ser mesmo o único possível. Mas estas questões, a nível musical, não são totalmente estranhas para Aversio Humanitatis: grande parte da concepção de “Longing for the Untold” foi feita em casa e isoladamente porque os membros estavam em países diferentes, enquanto “Behold the Silent Dwellers” foi criado em conjunto na sala de ensaios. Tendo passado por práticas tão distintas, abordámos o impacto que a distância pode ter no processo criativo. S. partilhou a sua experiência: «A distância tem, definitivamente, um papel no resultado final. Estarmos juntos numa sala de ensaios cria uma atmosfera específica, as composições resultantes são mais instintivas e cooperativas, apesar de serem trabalhadas mais tarde. Quando crias à distância, à frente de um PC, aguardando várias semanas para receber o feedback dos outros membros (se o tiveres), tudo fica mais vagaroso e analítico. Ambos os métodos têm prós e contras, há um tempo para cada um deles.»
A coesão das faixas e a articulação entre elas é um dos aspectos mais impressionantes do álbum e sentimos que o todo também foi meticulosamente lapidado. Por exemplo, como quando no fim da última faixa “The Scribe of Dust”, somos deixados em suspenso, ansiando por mais. O guitarrista explica-nos como o conseguiram: «A maioria das músicas foi composta ao mesmo tempo, em vez de uma após a outra e com algum tempo entre elas. Portanto, em todos os momentos, tínhamos a imagem do álbum, no seu todo, muito vívida e presente, o que nos permitiu constantemente moldar as músicas de forma a irmos incorporando os elementos em falta ou descartando aqueles que se tornavam repetitivos, mantendo cada música como uma entidade singular, como um capítulo diferente da mesma história, mas também uma boa coerência entre todas elas. Sempre tivemos o desejo de compor desta maneira, mas agora conseguimos alcançá-lo com mais clareza.»
E como se não bastasse a música sumptuosa, também estamos perante uma incrível unidade conceptual. Responsável pelo tema, letras e arte visual, A. foi beber inspiração na arquitectura brutalista. Sobre o conceito que criou, podíamos apenas fazer uma interpretação, ficando a curiosidade em saber se correspondia às intenções do seu autor. Por isso, questionámos a relação que estabeleceu entre o niilismo e os princípios dessa corrente arquitectónica. «Acho irónico como a arquitectura brutalista, e a funcionalista de um modo geral, nasceu com as necessidades da população em mente e acabou como ícone da alienação absoluta. Todo o álbum gira, precisamente, em torno dessa a ideia de como criamos os nossos próprios grilhões e acabamos por ser esmagados pelas engrenagens que mantêm o nosso sistema em movimento.»
Ao surgir a notícia de que Adversio Humanitatis tinha assinado pela Debemur Morti Productions, soubemos que algo de relevante viria aí. A editoraganhou reputação pela qualidade do seu black metal e, apesar de procurarem diversidade, são bem criteriosos na selecção de bandas. Mesmo na presença das redes sociais e das plataformas de streaming, somos levados a pensar sobre quão importante é, nos dias de hoje, o papel de uma editora enquanto escola e enquanto aglutinador de músicos com formas de expressão convergentes. O mentor da banda comenta: «Creio que se resume bem dessa forma. Algumas dessas editoras são grandes referências às quais tanto o público como as bandas (a maioria dos músicos também são consumidores) vão descobrir as melhores bandas de cada subgénero, para ver o que se passa e em que nível se encontra a bitola da qualidade. Elas desempenham uma certa função de filtro – embora possamos discutir se isso é bom ou mau, acho que depende da editora, mas aqui estamos a falar das de qualidade. As editoras desempenham definitivamente um grande papel, não apenas do ponto de vista do negócio, necessário à existência das bandas, mas ainda sob o ponto de vista artístico, elas ajudam a moldar tudo isso. Claro que também deves ficar de olho no que as bandas novas e independentes estão a fazer, não podes depender apenas do que as editoras grandes e médias te alimentam.»
Como referimos, S. também é produtor musical, tendo fundado em 2016 o The Empty Hall Studio (localizado em Madrid e focado em metal extremo, onde produziu este álbum e, por exemplo, o de Selbst que será lançado em Agosto), e aproveitámos para falar um pouco sobre produção. Claro que ouvir a mesma música em vinil e num smartphone com uma equalização estranha pode resultar em experiências radicalmente opostas. Isto será um factor sensível para qualquer álbum de metal extremo e mais ainda quando o nível de detalhe é elemento-chave, como é caso. Perguntámos como encara essa inevitável transfiguração do seu trabalho, depois de ter dedicado tantas horas à produção. «Bem, um dos meus objectivos como engenheiro de som e produtor é fazer uma mistura que se traduza bem em diferentes sistemas de som, minimizando ao máximo essas grandes diferenças. Geralmente, quanto melhor a produção, menor será essa diferença radical entre vários dispositivos. Mas é claro que é algo muito mais complexo e no qual entram muitas variáveis, algumas delas inevitavelmente pioram a audição. Acho que se alguém ouvir um álbum com o altifalante mono de 5 mm do smartphone merece que a escuta seja uma experiência merdosa. [risos] Tento dar o meu melhor, mas também espero que as pessoas escutem o nosso álbum com um par de colunas ou auscultadores decentes se o quiserem realmente apreciar, mas isso já é com elas.» E nós recomendamos que o leitor faça isso mesmo durante os próximos 36 minutos, pois escutará um dos álbuns black metal mais faustosos de 2020.
Lê a análise ao álbum AQUI.


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