Tuomas Holopainen e Tarja Turunen relembram a música que fez os Nightwish alcançarem uma audiência de milhões.

Tuomas Holopainen e Tarja Turunen relembram a música que fez os Nightwish alcançarem uma audiência de milhões.

A maioria das bandas de sucesso pode traçar a sua ascensão à glória num momento específico no tempo. Para os finlandeses Nightwish, campeões indiscutíveis do metal sinfónico, esse momento surgiu com o lançamento de “Nemo”, o primeiro single do quinto álbum da banda, “Once”. Apesar de já se terem estabelecido como uma grande força na Europa e na América do Sul, foi a música “Nemo”, lançada em 2004, que provou ser o maior marco internacional da banda.

Com os Nightwish a serem os mais extravagantes porta-estandartes do metal, pedimos a Tuomas Holopainen (fundador, força motriz criativa e maestro das teclas) e a Tarja Turunen (ex-vocalista) para voltarem a pensar na música que lhes trouxe fama mundial. Tuomas explica que foi um parto doloroso.

«Lembro-me claramente que a “Nemo” é uma das músicas mais difíceis que já fizemos», conta. «Foi muito, muito difícil fazê-la funcionar. Trabalhámos o arranjo durante meses, apenas para termos as letras e as melodias completamente no ponto. Não sei porquê. Originalmente tinha mais dois minutos e era mais rápida, mas o Tero [Kinnunen], engenheiro da gravação, disse: ‘Esta parte é completamente estúpida. Tira isso, e temos de desacelerar uns 10bpm.’ Reorganizámo-la várias vezes. Já nem me lembro como era originalmente. Deve estar numa das minhas disquetes!»

Muitas pessoas presumiram que a música era algum tipo de homenagem a “Nemo” da Disney ou ao Capitão Nemo do romance clássico de Júlio Verne, “20.000 Léguas Submarinas”, mas a verdade é que foi inspirada pelo conturbado estado emocional em que Tuomas se encontrava na altura da composição.

«Era apenas uma sensação sobre não ser suficiente, uma sensação sobre ser uma pessoa terrível e e que lixa tudo», explica. «Todos temos esses momentos de vez em quando – momentos mais fracos quando realmente não sabes quem és. Não tens nome, não tens rumo. É daí que vem o título “Nemo”, que significa ‘sem nome’ [em latim]. É basicamente uma música catártica sobre mim. Eu era uma pessoa muito mais sombria do que sou agora. Nunca faria uma música como esta novamente, mas foi o mais honesto possível. Era uma página do meu diário e tinha de mandar essas emoções cá para fora. Sentia-me muito sozinho.»

Agora sabemos que “Once” seria o disco álbum de Tarja com os Nightwish, mas a vocalista guarda boas recordações de quando ouviu e cantou “Nemo” pela primeira vez à medida que o luxuoso e ambicioso álbum era montado durante o Inverno de 2003 e o início de 2004.

«Quando o Tuomas a tocou para mim pela primeira vez, achei que a “Nemo” era uma música fácil de compreender, com uma melodia linda e cativante», recorda. «Gostei mesmo. Não se tornou imediatamente uma das minhas favoritas, porque geralmente preferia as músicas mais longas e complicadas dos Nightwish, mas era óbvio que aquela música tinha de ser um single. Costumo ficar um pouco mais nervosa ao gravar uma música quando sei que é um single, mas o objectivo é apenas conseguir um bom take e fazer dela uma excelente música. Diverti-me muito a cantá-la.»

Embora parecesse inevitável que os Nightwish continuassem em frente e em ascensão com o lançamento de “Once”, foi o single “Nemo” e o seu vídeo sumptuoso e melodramático que deram à banda aquele impulso importantíssimo para os holofotes globais. Custando cerca de 80.000€ – uma quantia enorme para uma banda de metal em 2004 – e criado em colaboração com o realizador finlandês Antti Jokinen (que dirigiu o thriller “The Resident”, de 2011, com Hilary Swank), o videoclipe teve grande rotação nas estações de TV em todo o mundo. Era um retrato vívido, mas melancólico, da banda a actuar no meio duma paisagem montanhosa e cheia de neve, com Tarja a destacar-se pelo seu casaco vermelho esvoaçante. O visual marcante combinado com as melodias irresistíveis da música, elegantemente elevadas pela London Session Orchestra, garantiram que “Nemo” tinha um grande impacto.

«O vídeo era sombrio, mas marcante e colorido, e era muito gótico», diz Tarja. «Conseguimos muitos fãs góticos depois daquele vídeo! Não acho que os Nightwish alguma vez se tenham considerado uma banda gótica, mas tivemos muita apreciação daí. Tenho uma amiga finlandesa que é costureira e tem sido responsável por muitas das minhas roupas. Tivemos a ideia do casaco vermelho – uma cor muito forte em contraste com a neve que cai. Se pensares em bandas de metal sinfónico com cantoras, geralmente elas vestem-se de preto. Sempre fui a miúda estranha com a voz estranha – os vocais operáticos –, e depois visto aquele casaco vermelho! [risos] Ainda vejo raparigas nos meus concertos vestidas como eu, portanto acho que foi muito poderoso.»

Contudo, nem toda a gente ficou imediatamente impressionada com a visão opulenta dos Nightwish, como Tarja explica.

«Recebemos um ‘não!’ inicial da MTV, porque eles não queriam rodar um vídeo que se passasse na neve!», ri. «Nós pensamos: ‘Por que é que estão a exibir vídeos na praia durante o ano todo, mas não querem mostrar neve a cair?’ Algumas estações de TV não queriam passar o vídeo, mas foi muito importante para nós. Muitos jovens ficaram a conhecer-nos através dessa música.»

Lançada a 19 de Abril de 2004, “Nemo” foi sem dúvida o principal catalisador para impulsionar os Nightwish às maiores alturas. O burburinho à volta da banda já era inegável, mas a conquista do single na TV e no mundo online em rápida expansão garantiu que quando “Once” fosse lançado, pouco menos de dois meses depois, disparasse para o topo das tabelas por toda a Europa, e, de repente, os finlandeses viram-se anunciados como o fenómeno musical de 2004.

«Acho que a maior notícia é que o álbum foi o mais vendido em toda a Europa durante duas semanas», graceja Tuomas. «Foi inacreditável. Foi então que dissemos: ‘Ok, agora sabemos que algo está a acontecer!’ Não acho que isso nos tenha feito mal à cabeça. Estávamos do tipo: ‘Uau! Quem diria!’ Havia todos aqueles grandes nomes de todo o mundo e estavam abaixo de nós… Pensei: ‘O que é que está a acontecer? Ok, vamos simplesmente aproveitar!’ Foi simplesmente fantástico. Toda a gente na banda se sentia muito feliz, e estamos a falar de 2004 porque 2005 foi do pior para nós. Mas lembro-me que 2004 foi simplesmente lindo, o ano inteiro. Estava tudo feliz com o sucesso e com os concertos. Lembro-me que tocámos no Astoria em Londres. Foi a primeira vez que tocamos lá, e eles tinham uma placa lá fora que dizia: ‘Tonight! Nightwash!’ Nunca me vou esquecer disso! [risos]»

Como Tuomas sugere, o sucesso esmagador que os Nightwish tiveram após o lançamento de “Once” acabaria por levar a uma separação amarga com a vocalista no final de 2005. Mas olhando para trás, está claro que o impacto de “Nemo” e do álbum foram fundamentais para a popularidade sustentada e potência comercial que a banda continua a desfrutar até hoje. Se por um lado tinham trabalhado arduamente para concretizaram as suas ambições, por outro a realidade de se tornarem grandes significava que as suas vidas mudaram a um ritmo alarmante, e Tarja lutou para se ajustar.

«Sim, de repente toda a gente queria um bocado de nós, e foi estranho», observa. «As salas eram enormes e isso era óptimo, mas não sei se consegui desfrutar muito. Foi tão rápido. Não sei se alguém consegue realmente gostar disso. Estávamos num túnel de vento, sabes? Ainda éramos jovens e trabalhámos muito para realizarmos os nossos sonhos, mas na altura foi um bocado assustador. Por eu ser, de certa maneira, a única mulher na estrada, eu era sempre quem toda a gente via em primeiro e queria falar, e os rapazes fugiam sempre! [risos] Havia muita pressão envolvida. Não foi um momento fácil para a banda. O sucesso aconteceu, mas foi difícil lidar com isso. Se agora me perguntarem se gostei, não posso dizer que sim, e isso é triste, não é?»

De uma maneira apropriadamente dramática, Nightwish e Tarja seguiram caminhos diferentes no final da digressão de “Once”. Anos depois, ambos os lados estão evidentemente orgulhosos da música que fizeram em conjunto e da longevidade que ambos alcançaram devido ao notável sucesso compartilhado. Os Nightwish estão maiores do que nunca sem mostrarem sinais de perderem o ímpeto e a carreira de Tarja como artista a solo também vai de vento em popa. Continuou a cantar “Nemo” e outras músicas de Nightwish durante os seus concertos, o que diz tudo sobre a magia duradoura que criaram anos antes. Enquanto isso, Tuomas mostra-se satisfeito em reconhecer que “Nemo” continua a ser uma das canções mais importantes que já escreveu e um exemplo brilhante de como a música pode mudar vidas e tornar sonhos realidade.

«Pode parecer lamechas, mas percebes que as letras e a música serão ouvidas por muitas pessoas, por isso, de certa maneira, partilha-se a dor e a frustração com o mundo inteiro, e isso ajuda bastante», conclui. «Quando a música é tão honesta, acho que isso ajuda as pessoas que a estão a ouvir, portanto todos ganham. Essa é a beleza da arte na sua essência, mesmo ali.»

Consultar artigo original em inglês.

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