Em entrevista à Metal Hammer Portugal, Max Cavalera aponta para um novo álbum de Soulfly em 2021, pensa numa colaboração com Jairo Guedz e... Max Cavalera: «Conquistei o meu sonho, que é viver da música – era o que queria»

Em entrevista à Metal Hammer Portugal, Max Cavalera aponta para um novo álbum de Soulfly em 2021, pensa numa colaboração com Jairo Guedz e vai contra o conservadorismo.

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Devido à pandemia, o sector musical está totalmente parado e tal situação deixou os músicos com muito tempo livre. Questionado sobre como está a passar esse tempo, Max disse: «Estou a aproveitar esse tempo para ficar mais criativo, para compor. Já tenho bastantes composições para o novo disco dos Soulfy. E fiz umas coisas muito porreiras também – tenho um programa ao vivo no Facebook, chamado “Max Trax”, que sai todas as terça-feiras e sábados, onde toco músicas que fiz durante a minha carreira, como clássicos de Sepultura, Soulfy, Nailbomb… Já fizemos seis episódios, e os fãs estão a adorar! Mas não vejo a hora de voltar a tocar, já temos vários concertos marcados para a Europa, portanto estou bastante feliz quanto ao ano que vem.»

Os irmãos Cavalera travam uma amizade muito forte com o Jairo Guedz, primeiro guitarrista dos Sepultura, e quando tocaram na sua cidade natal – Belo Horizonte, Minas Gerais – convidaram o músico para uma participação no concerto. Sobre uma possível parceria num álbum com Jairo e Iggor, respondeu: «Seria porreiro, temos uma ligação muito boa; aliás, um dos próximos episódios do “Max Trax” quero fazer algo bem antigo, talvez “Troops of Doom” ou “Funeral Rites”, que é do álbum “Morbid Visions”. A nossa época foi bem porreira. O Jairo é muito gente fina, e, com certeza, quando o Iggor e eu resolvermos tocar o “Bestial Devastation” e “Morbid Visions”, vamos convidá-lo. Mas fora isso, talvez um futuro projecto. Adoro esses projectos, que não têm nenhuma regra sobre o que podemos ou não fazer. Somos nós que fazemos as nossas próprias regras, por isso estou sempre envolvido em muita coisa, muitas participações.»

Sobre traçar um paralelo desde os tempos do “Bestial Devastation” até aos dias actuais, com o Soulfly e Cavalera Conspiracy, Max prefere não fazer análises: «O segredo é não analisar. Quando se começa a analisar muito, começa-se a pensar muito e a fazer-se autocrítica – acho que atrapalha. Tem que deixar rolar. Nunca tive aulas de voz, não sei como que sai a minha voz, e não quero saber como sai, só sei que existe e está lá. Essa é a parte mágica da música – não é preciso analisar ou entender. Faço isso com a minha carreira. Deixo isso para os outros, para as pessoas que fazem os “melhores discos de Max” e etc.. Deixo que o público faça isso, fazer uma análise. Gosto de estar ocupado, de fazer os meus sons. E em tudo o que faço, coloco o meu coração, coloco a minha alma, e fico sempre empolgado com os meus trabalhos. Neste momento, estou muito empolgado com as novidades de Soulfy, que devem sair no ano que vem.»

«Sempre gostei das letras do punk, mais do que as do metal.»

Max Cavalera

Os álbuns “Roots” e “Chaos A.D.” contêm muitas letras políticas sobre a situação pela qual o Brasil passava, além de se enaltecer características e símbolos brasileiros – como a cultura indígena, escravatura, herança africana, o seringueiro e activista Chico Mendes, ditadura militar, candomblé, o cineasta Zé do Caixão, Amazónia e Jiu-jitsu barsileiro. Max dá-nos a sua opinião sobre letras políticas, preconceito e conservadorismo na cena metal: «É bom esse lance do metal ter algo para falar, uma coisa que mudou nos últimos 30 anos. Nós viemos de uma era do metal que é misturada com punk rock, principalmente o nosso começo, e, na época dos nossos primeiros discos, eu e o Iggor escutávamos muito punk rock, e eu gostava das letras – sempre gostei das letras do punk, mais do que as do metal. Então, fui para esse lado mais politizado. Quando comecei a fazer músicas com uma consciência mais política, veio mais o lado punk das coisas que escuto, como Dead Kennedys, Black Flag, GBH, Discharge… Hoje em dia, o meu trabalho ainda tem um pouco de política, mas é mais misturado, tem outros temas. Curto fazer letras políticas, mas não quero cair no lance de ser taxado como uma banda política, quero a liberdade de falar do que eu quiser. Gente conservadora, que fala mal, vai haver sempre, principalmente hoje com a Internet – há gente que vai para a Internet só para falar mal. Mas isso sempre houve. Quando gravámos o primeiro EP “Bestial Devastation”, houve muita gente a criticar, a dizer que a banda se vendeu porque gravou um EP – há gente que quer que fiquemos na caverna. Não se pode escutar essas pessoas, tens que fazer o que queres, o que o coração e a cabeça mandam. Mas do que eu gosto, e que há no metal, é da irmandade entre as pessoas – muitas pessoas de cores, culturas e religiões diferentes, e são ligadas pelo metal. Em qualquer parte do mundo, o que nos liga é o metal. E uma das minhas esperanças é que haja menos racismo no metal, termos no metal aquilo que a sociedade fracassou.»

Sempre que o público fala sobre o Brasil, a primeira coisa tem a ver com os Cavalera e os Sepultura. Estes nomes ganharam uma importância enorme na história da música pesada. Hoje, Max sente orgulho do seu trabalho, e nunca imaginou chegar até onde chegou: «Nunca imaginei, na época em que começámos. Só queríamos tocar, pois no Brasil não existia nada desse tipo, de música extrema, e queríamos soar como os nossos ídolos. Então, quando fizemos um disco que influenciou muito o black/death metal mundial, como o “Morbid Visions”… Tenho muito orgulho desse disco até hoje. É gratificante ver bandas a fazerem covers desse álbum até hoje, como os Watain que acabaram de lançar, em Julho, uma cover de “Morbid Visions” [presente no EP “Corona Mortis”], e os Immolation também já gravaram. É muito porreiro ver que, até hoje, esses discos marcaram as pessoas para sempre. Não só o “Morbid Visions”, mas também “Arise”, “Beneath the Remains”, “Chaos A.D.” e “Roots”, que influencia outra malta, como os System Of A Down, Slipknot, Deftones… Nunca pensámos que fôssemos atingir esse auge em que estamos hoje em dia, ser muito celebrado, dar para viver da música. Para mim, conquistei o meu sonho, que é viver da música – era o que queria. Não tenho ambição de coisas materiais, como ganhar um Grammy, estar na capa de todas as revistas. Estou a fazer o som de que gosto, estou ligado ao underground que adoro, e, para mim, isso é o mais importante.»